O lobby, no Brasil, não é
atividade legal, mas sinônimo de “simples pressão, tráfico de influência ou
corrupção”; é o significado pejorativo que a imprensa empresta ao termo.
Houaiss registra: “amplo salão ou vestíbulo na entrada de um hotel, teatro ou
de qualquer prédio extenso; atividade de pressão de um grupo organizado (de
interesse, de propaganda etc.) sobre políticos e poderes públicos, que visa
exercer sobre estes qualquer influência ao seu alcance, mas sem buscar o
controle formal do governo”.
A atuação direciona-se
principalmente para os poderes Executivo, Legislativo e Judiciário, porque as
decisões desses órgãos influenciam todo um grupo social, motivando a
movimentação política.
O lobby em si é essencial para a
prática da democracia, porque leva informações técnicas, conduz os anseios da
sociedade civil às autoridades públicas, além de atuar em busca de benefícios
lícitos e constituir elo de comunicação do povo com o Estado.
Os empresários se movimentam em
defesa de seus interesses de há muito tempo. Os tratadistas sobre a matéria
informam que a Associação Comercial da Bahia, fundada em 1811, destinou-se a
influir (fazer lobby) junto ao Congresso Nacional da primeira República.
É necessária a legalização do
lobby, pois, enquanto a atividade permanecer sem regulamentação, os abusos
continuarão sendo perpetrados, algo semelhante ao jogo do bicho. O Projeto de
Lei n. 203, apresentado pelo senador Marco Maciel, em 1983, aprovado no Senado,
em 1989, sob n. 6132, continua engavetado na Câmara dos Deputados, desde o ano
de 1990. Há emenda que permite a atuação dos lobistas somente ao nível das
casas do Congresso Nacional, não possibilitando a ação no Executivo, apesar de
estudos mostrarem que 85% dos projetos em tramitação nas casas legislativas
originam-se do governo; proíbe-se também ingerência dos lobistas no Judiciário.
Desde a promulgação da
Constituição, em 1988, foram apresentados 12 projetos na Câmara dos Deputados,
mas o lobby continua sem regulamentação alguma. Os projetos, quase todos, foram
arquivados.
A omissão do legislador
proporciona condições para proliferação desenfreada e perniciosa do lobby,
junto aos tomadores de decisões, influenciando convicções com recompensas
ilegais, corrupção, vantagens indevidas, dinheiro, etc.
O alcance do trabalho dos lobistas
é bastante polêmico; uns asseguram que o Parlamento é constituído de deputados,
lobistas por natureza; o mesmo ocorre em relação ao Judiciário, porque conta
com advogados para falar pelas partes. Na verdade, o lobby auxilia aos
congressistas, vez que ação sem maiores compromissos, apta a promover estudos,
seminários, debates.
Mais complexo se apresenta quando
se imagina lobby no Judiciário; é que, além de motivações éticas, o
jurisdicionado fraco só tem a perder; já sofre com a falta de recursos para
contratar bons advogados e a desvantagem se acentua, na medida em que os
poderosos receberem passe livre para pressionarem juízes nas suas decisões,
tomadas em função somente do justo, do injusto, do legal, do ilegal.
A imprensa tem prestado relevantes
serviços à dignidade e à cidadania, quando denuncia inúmeros casos de lobby
abusivo, fora da lei e através da corrupção, verificados principalmente nos
últimos anos no país.
Nos Estados Unidos, a ação dos
lobistas é regulamentada, desde o ano de 1946. A palavra significa “sala de
espera”, local onde ficavam as pessoas na expectativa da chegada da autoridade
para negociar e conversar.
O lobby no Legislativo implica no
acompanhamento dos projetos que correm naquela casa, seguido de estudos
técnicos e de propostas para aperfeiçoamento da medida.
Os lobistas entram até mesmo em
comissões para obtenção de boas leis. Evidente que o lobby pode influenciar os
autores deste ou daquele projeto pelo impacto e pela repercussão que causa no
segmento social ao qual se destina. O campo de atuação dos lobistas, no
Legislativo, é vasto, pois passa pelas comissões, pelos seminários, que
freqüentemente se instalam para discussão e aperfeiçoamento dos projetos, e
chega ao plenário das casas parlamentares.
No Executivo os lobistas também se
movimentam, porque aí se origina a maioria das leis do país; a influência,
nesta área, anda pela discussão do assunto para encaminhamento ao Parlamento
até o momento de decisão final, ou seja, sancionar ou vetar a proposição
discutida e aprovada no Legislativo.
No Judiciário não se entende nem
há espaço para atuação de lobistas, mas não resta dúvida de sua perigosa
movimentação.
Inúmeras demandas têm tomado rumos
diferentes do verdadeiro sentido da missão judicial. O deslustre da
magistratura começa pelas Cortes superiores e desaba nas mãos dos juízes.
Um dos exemplos mais propalados
teve como protagonista Roberto Bertholdo, advogado, cognominado, pela revista
Isto É, de “o articulador de sentenças”. Beltholdo foi cotado para assumir
ministério no governo Lula, mas terminou na cadeia, fruto de ação penal pública
de iniciativa do Ministério Público de Curitiba; o processo envolve ministros e
ex-ministros do STJ. Dentre outros crimes, apurou-se compra de decisão judicial
para trancamento de ação criminal para viabilizar candidatura política.
A Operação Diamante, da Polícia
Federal, culminou com o afastamento ministro Vicente Leal, em abril de 2003, do
STJ, por suspeita de venda de decisões judiciais para narcotraficantes. Em
2004, pediu aposentadoria do Tribunal.
Outro exemplo de lobby no STJ
prende-se ao chamado “crédito-prêmio do IPI”. A Corte superior, em julgamentos
anteriores, admitiu manutenção do Dec.-Lei n.
491 de 1969, instituído, para compensar os exportadores de produtos
industrializados, pelos tributos pagos internamente; abruptamente alterou o
entendimento, sob o fundamento de “razões de estado” e negou aos exportadores o
que já tinha concedido. O lobby do governo junto ao STJ prevaleceu, em prejuízo
dos contribuintes.
A Operação Anaconda, empreendida
pela Polícia Federal, juntamente com o Ministério Público, desbaratou esquema
de extorsão e venda de sentenças; um dos envolvidos, o juiz João Carlos da
Rocha Matos que absolveu culpados, encontra-se preso desde o ano de 2003. Neste
caso, grandes indústrias farmacêuticas corromperam (lobby) magistrados para
impedir a comercialização de medicamentos genéricos.
Em Curitiba, os jornais noticiaram
que um desembargador, além de interferir pelo favorecimento de seus protegidos,
chegou a redigir uma sentença para a juíza assinar, não admitindo a cobrança de
Imposto sobre Serviços dos escritórios de advocacia da cidade.
O juiz Nicolau dos Santos Neto foi
promovido ao Tribunal Regional do Trabalho através do apadrinhamento político.
Por decreto, permissão constitucional anterior, foi nomeado pelo
general-presidente Emílio Médici para o cargo de procurador do Ministério
Público do Trabalho, em 1970; posteriormente, em 1981, foi escolhido como
magistrado e depois pelo quinto constitucional chegou ao TRT. Foi afastado da
magistratura e preso por corrupção.
Há quem entenda que a parceria,
celebrada entre a Souza Cruz e o Judiciário, no ano de 2004, tenha sido lobby
da empresa para obtenção de favorecimento em uma ADIN, na qual se pedia liminar
para retirar restrições de publicidade de cigarros.
A imprensa noticia que um
ministro, em plenário, acusou, um ex-presidente do STF de atuar como lobista em
defesa de um cliente, do Paraná, em processo sobre desapropriação. O caso
envolvia liberação de um montante de R$100 milhões.
O lobby do governo junto ao STF,
por ocasião da apreciação da inconstitucionalidade da taxação dos inativos e
aposentados provocou danos irreparáveis; juízes, promotores, procuradores e
advogados, através de suas associações de classe, manifestaram a ilegalidade da
contribuição e preocupação com a “ingerência” do Executivo no Judiciário, mas
de nada valeu.
A Súmula Vinculante tem suas
vantagens, mas induvidosamente carreará maior força para o lobby do governo
junto aos tribunais superiores. É que os ministros do STF, responsáveis pelas
Súmulas Vinculantes, são nomeados pelo Presidente da República e o critério
fundamental é político.
Será que estamos caminhando para a
cleptocracia?
Salvador,
junho/2014.
Antonio
Pessoa Cardoso.
OAB
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