Os fóruns recebem
não só os operadores do direito; acolhem também os ratos, os morcegos, as
baratas, as traças e os cupins. Servidores e juízes, de quando em vez, esbarram
com esses animais nos gabinetes, nos cartórios e nas salas de audiência. No ano
passado, o Pleno do Tribunal de Justiça da Bahia promoveu intensos debates
sobre as ratazanas que ousaram invadir um cartório de uma vara judicial na
capital. Não se falou do assunto sobre as comarcas do interior, porque a discussão
prolongaria bastante, tamanha é a audácia desses bichos nas casas velhas,
transformadas em fóruns. A situação é tão dramática que alguns servidores vão
para suas casas, usando desvios, para evitar que os bichos sigam-lhes, à noite,
quando saem dos fóruns.
Como falávamos,
aquela discussão deu-se, porque houve um ato de órgão superior, suspendendo o expediente
no cartório, porque as ratazanas passeavam pelo chão, pelas mesas, brincavam
com os processos e tomavam conta do ambiente.
A juíza e os
servidores não acharam nada engraçado. O incômodo foi levado para o Pleno do
Tribunal e houve verdadeira celeuma sobre o palpitoso tema tão cheio de nuances
que reclamava até a participação de um médico veterinário. O Pleno não convocou
especialista, pois iria chamar muito a atenção e teria que ser suspensa a pauta
de julgamentos. Não me lembro se nesse dia, apareceram defensores dos ratos nos
fóruns, mas inclino-me a acreditar que alguns pensaram em conjecturar sobre os
benefícios desses mamíferos dentre os quais: principais animais de experimentos
biológicos e psicológicos e que possuem grande analogia com os seres humanos,
portanto, de enorme utilidade para as descobertas na área médica; maníferos de
estimação para muita gente, daí a dispensa de bom tratamento e preservação.
Outra intervenção
que poderia ser feita, em defesa dos ratos nos cartórios, é de que, no Rio de
Janeiro, no fórum de Campo Grande, eles alimentavam dos processos e houve
necessidade de interdição, porque já se imaginava os benefícios para uns ou
malefícios para outros. Os primeiros, na condição de réus dos processos
louvariam à presença dos ratos, porque sem intervenção do juiz o processo seria
extinto, diante da fome e do alimento disponível, constituído de toda a papelada; enquanto
para outra, o autor, excomungaria os bichos, vez que seria, de certa forma,
improcedente seu pedido. Assim, para o bem ou para o mau, a presença dos ratos nos
cartórios contribuiria bastante para diminuir a papelada desnecessária.
Se não fosse a
pressa de alguns advogados, certamente, um deles iria pedir a palavra para
apoiar algumas intervenções e também emitir sua opinião; discorreria sobre os
ganhos que trazem esses camundongos; alguns advogados não sabem, por
exemplo, que os roedores servem como dispersores de sementes, como polinizadores
e como recicladores de matéria orgânica; ademais, eles se protegem, nesses
ambientes, contra os predadores naturais da espécie.
Evidente que os do
contra iriam dizer das doenças transmissíveis pelos ratos, a exemplo da
leptospirose; mas, o advogado, que endossava a tese de alguns desembargadores,
diria que aí é exatamente onde reside o interesse para desativar, agregar
comarcas, pois os fóruns estão em casas velhas, e, portanto, mais apropriadas
para os roedores livrarem-se dos predadores; os servidores, apesar da
perseguição que sofrem quando vão para casa e do desconforto, não entram na
discussão, porquanto são forçosamente defensores dos ratos, porque já
acostumados com sua convivência.
O debate não
demorou mais tempo, porque uns advogados, no Pleno, já se mostravam
impacientes, com o atraso para julgamento de seus processos que estavam na
pauta, mas passível de adiamento. Esses poucos advogados que só pensam nos seus
próprios interesses diziam que não há vantagem alguma em discutir naquele local
sobre a utilidade ou inutilidade dos ratos nos fóruns. Com essa manifestação mostravam-se
desatentos e desconhecedores da realidade, pois não sabiam avaliar a
significação profunda do assunto. Afinal, a Corte tem a obrigação de melhorar o
ambiente do trabalho, já que alega não ter recursos para construir novos
fóruns, instalados em casas velhas, espaço dominado pelos ratos.
Depois da sessão,
alguns advogados comentavam sobre o acerto do Tribunal com a desativação,
agregação, seguida da extinção de comarcas, porque assim não haveria
necessidade de desalojar os ratos das casas velhas onde estão os fóruns,
atrapalhando a manutenção dos roedores, que tem quase todos os genes
semelhantes aos humanos. Isso é importante porque daqui há pouco descobriremos
como preservar a vida do homem por mais tempo.
É tudo muito
pensado, muito discutido no Tribunal.
Salvador, 16 de agosto
2014.
Antonio Pessoa
Cardoso.
PessoaCardosoAdvogados
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