Os assassinatos de juízes, delegados, militares e de gente do povo demonstra o descaso que se tem emprestado para a segurança pública. Tais ocorrências provocam consternação, revolta, além de incutir profunda preocupação nos agentes do Estado, fundamentalmente para os que lutam contra o crime organizado; constata-se que o Poder Público não disponibiliza, como é de sua obrigação, de eficiente garantia de segurança pública para seus servidores, muito menos para os cidadãos, apesar de exigência constitucional.
Os mortos são retirados do convívio de suas famílias, prematuramente, pela fúria animalesca e sem peias dos bandidos. Os homens da Segurança Pública e do Judiciário tombam na batalha ingrata e desigual que travam no dia a dia contra os criminosos, buscando sempre proteger a comunidade.
O crime organizado executou a juíza Patrícia Acioli do Rio de Janeiro, o juiz Alexandre Martins de Castro Filho, em Vitória, ES, e o juiz-corregedor Antonio José Machado Dias, da Varas de Execuções Criminais de Presidente Prudente, SP, todos destacados profissionais.
Apesar de os brasileiros viverem em clima de paz, porque não há guerra declarada, os números dos assassinatos no país assustam e mostram a existência de uma guerrilha urbana; com efeito, em média, no Brasil, por ano, são assassinadas quase 50 mil pessoas. Entre os anos de 1997 e 2007, foram registrados mais de quinhentos mil homicídios, superando os números dos mortos na Guerra do Golfo.
Sabe-se que não há sociedade sem crime e, portanto, impossível acabar com a criminalidade; todavia, perfeitamente viável não deixar que o crime assuma grandes proporções, ao ponto de equiparar os assassinatos ocorridos em um país em paz com nações em guerra.
Bem apropriada a expressão atribuída ao economista norte-americano, Jeffrey Sachs:
“Estado desorganizado; crime organizado”.
Estudiosos concluíram que “A polícia brasileira tem uma produtividade das mais baixas do mundo. A polícia americana resolve 22% dos crimes. A inglesa, 35%, a canadense, 45% e a japonesa, 58%. No caso do Brasil, a taxa de solução é de apenas 2,5%”.
Esta situação não se apresenta em face de incompetência de nossos profissionais, mas por ausência de investimentos e absoluta falta de estrutura nos ambientes de trabalho. Não se prioriza o homem e não se tem tecnologia adequada para o combate aos criminosos. Na verdade, a polícia brasileira é muito cobrada, porque se reclama seriedade, mas nega-lhe uma vida digna; exige-se criatividade nas incertezas do trabalho, porém não lhe oferece meios; imagina-se no policial a figura de um super-herói, mas lhe nega remuneração digna, condizente com a natureza do risco, armamento à altura de enfrentar os marginais, capacitação, aposentadoria especial.
Essa situação de ineficiência do Estado na segurança pública provoca pânico no cidadão que visualiza do outro lado a força do crime organizado, através das milícias privadas. Acentua-se o medo no Brasil: tem-se medo de tudo, medo do desemprego, medo da doença, medo da morte e medo da violência.
O resultado é o que vemos em todo o Brasil, quando o homem honesto não tem segurança em casa, porque os assaltantes não respeitam o refúgio do lar, mas não se pode sair de casa, porque a rua é dos bandidos.
O Estado mantém sob seu controle a segurança pública, através das forças policiais, civis e militares; estes atuam ostensiva e preventivamente com o fim de inibir e evitar a ação de criminosos, enquanto a polícia civil é destinada a investigar e punir o crime. Todos os servidores das polícias são arregimentados e pagos para proteger o cidadão e o patrimônio públicos e não para tornarem-se mártires de uma causa, como já está ocorrendo.
A Constituição Federal, art. 144, estabelece que a segurança pública seja dever do Estado, mas a incúria dos governantes obriga as empresas e os cidadãos a assumir suas defesas para garantir sua própria vida, através da colocação de grades de proteção, de alarmes, de cachorros, de contratação de vigilantes particulares, em suas casas.
As leis de uma maneira geral preocupam-se mais com o criminoso do que com a vítima, com o patrimônio do que com o ser humano, beneficiam o estelionatário em detrimento do homem honesto, agradam mais ao bandido, ao infrator do que ao cidadão cumpridor de seus deveres cívicos.
A caracterização de inércia ou omissão do Estado provoca a aplicação do direito para forçá-lo a assumir a responsabilidade objetiva, art. 37, § 6º da Constituição, pelos danos causados. Infelizmente, talvez por falta de conscientização, o Judiciário é pouco chamado para promover as devidas reparações aos prejuízos causados ao cidadão pelo descaso do Estado com a segurança pública.
Por iniciativa popular a Lei “Ficha Limpa” impede as candidaturas de políticos condenados criminalmente por órgão colegiado da Justiça, ou seja, aquele condenado pelos tribunais não pode disputar votos. O mesmo princípio, condenação em 2ª instância, poderia ser aplicado para o criminoso, infrator contumaz. Todavia, as leis do país, que devem ser aplicadas pelos juízes, exigem condenação final, ou seja, percorrer o processo em todas as instâncias, com todos os recursos para só depois mandar o criminoso para a cadeia. O juiz aplica a lei, mas a sociedade e o cidadão sentem-se feridos com tais regalias conferidas ao infrator, sem perceber que o magistrado nada pode fazer, porquanto compete-lhe obedecer tudo aquilo que está escrito nas leis feitas pelos deputados e senadores.
O menor de 18 anos continua fazendo estragos, praticando assaltos, matando, servindo como anteparo para os bandidos de maior idade, mas a lei não o penaliza; incoerência, pois permitem que com a idade de 16 anos possam votar, ou seja, escolher quem vai fazer as leis.
A fixação da pena máxima em 30 anos constitui incentivo para a prática de crime de natureza grave, porque se o bandido é condenado duas vezes por latrocínio, por exemplo, não cumprirá uma segunda pena, porque a lei brasileira fixa o tempo máximo de cadeia em 30 anos; outros favores legais permitem que os criminosos saiam da prisão bem antes do tempo.
Os jornais noticiam que um empresário, na cidade de Vitória da Conquista, Bahia, de tanto ser roubado, buscou sensibilizar os marginais e colocou na frente de seu estabelecimento uma faixa:
“Senhores assaltantes, peço-lhes um tempo... Fui roubado três vezes em 20 dias. Respeitosamente, Cyber Conquista”.
O desenvolvimento econômico do Brasil e a fortaleza de suas instituições democráticas são verdades incontestes, como sem polêmica a afirmação de que a injustiça campeia pelas cidades e a insegurança pública é o temor de todo brasileiro. Apesar de o Judiciário e a segurança pública constituírem caminho para o verdadeiro exercício da cidadania, são segmentos desprestigiados, sem investimentos necessários para perfeito funcionamento. Não se prestigia o homem profissional, porque lhes negam condições de trabalho; neste quadro torna-se indispensável a despolitização das Secretarias de Segurança Pública.
A violência, antes limitada às ruas das grandes cidades, aportou às residências, aos supermercados, aos restaurantes, aos bancos, às rodovias, e chega até às pequenas cidades do interior, antes refúgio seguro. Os passageiros dos ônibus urbanos, intermunicipais e interestaduais já não viajam tranquilos; os motoristas de caminhões que cortam as rodovias nacionais são fontes de altas rendas, quando não perdem a própria vida, para os bandidos. Enfim, em todos os ambientes, o cidadão já não sente segurança alguma. A droga, apesar de proibida, está institucionalizada e recebe passaporte para entrada no país.
Às vezes, a vítima depara e reconhece seu algoz, mas não se arrisca a enfrentá-lo ou denunciá-lo, porque sabe que não encontrará providência alguma e só contribuirá para ser marcado para morrer; a polícia desculpa-se com a alegação de que quando prende a Justiça solta e os juízes dizem que soltam porque as leis mandam assim proceder.
Há um desleixo muito grande sobre as necessidades primárias de nosso povo. Rui Barbosa foi muito preciso quando disse que
“toda a capacidade dos nossos estadistas se esvai na intriga, na astúcia, na cabala, na vingança, na inveja, na condescendência com o abuso, na salvação das aparências, no desleixo do futuro”.
Além dos males físicos, psicológicos, éticos e materiais causados pela banalização da violência registre-se também o fato de que as mentes das gerações futuras mudam o conceito de tranquilidade, de lazer e tudo termina efetivamente em violência.
Salvador, 27 de setembro/2014.
Des. Antonio Pessoa Cardoso.
www.antoniopessoacardoso.com.br
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