domingo, 16 de novembro de 2014

DIA DO QUINTO CONSTITUCIONAL

Os advogados exultam com a benevolência e criatividade do presidente Getúlio Vargas, em defesa da classe, quando fez constar na Constituição de 1934 o sábio “instrumento de oxigenação do Poder Judiciário…”. A alegria é tão grande que, em abril de 2014, instituíram o Dia Nacional do Quinto Constitucional, festejado em 16 de julho, por ocasião das comemorações dos oitenta anos do instituto de oxigenação. 

Um juiz, vendo o contentamento dos causídicos, explica que o ditador Getúlio Vargas não visualizava beneficiar os advogados, mas procurava um meio para exercer domínio sobre o Judiciário. E nada melhor do que levá-los aos tribunais, como favor politico, facilitando assim sua interferência sobre o sistema judicial, ampliando seu controle sobre todos os poderes, porque o Legislativo já estava sob seu comando. Diz ainda o magistrado que essa Constituição que introduziu o quinto em 1934 foi a que menos tempo durou, 1934 a 1937, apesar de ter vigorado oficialmente apenas por um ano. Portanto, não é motivo para tanto júbilo, encerra. 

Mas ninguém vai questionar a feliz providência da classe dos advogados, quando estabeleceram a data comemorativa de ascensão de seus membros aos tribunais. São realmente vitoriosos, pois suas integrações implicam no combate ao corporativismo, inexistente entre os advogados, acabaram com o nepotismo, rechaçado na classe, males cultuados pelos magistrados. Evidente, se não fosse o quinto constitucional ainda estaríamos diante dessas e de outras mazelas. 

Não se pode esquecer da experiência trazida pelos advogados para a Justiça de segundo grau, adquirida nos longos dez anos de militância, indispensável para pleitear a indicação para o quinto. Foi-se o tempo no qual a escolha era feita pelos próprios tribunais entre advogados de renome, que se destacavam na carreira, militantes por muitos anos, com ética, técnica reconhecida e projeção no meio profissional; o nome era encaminhado ao Executivo que se incumbia de nomear. Atualmente, os advogados devem chegar mais cedo nos tribunais para não deixar que os juízes enodoem o ambiente por falta de experiência, trazida pelo bacharéis nos dez anos de advocacia. 

Merece aplausos, pois nada mais justo, diante do privilégio ousado defendido pelos juízes, que reclamam assento nos tribunais somente para eles, sem se importar com a oxigenação, elemento indispensável para a vida. O oxigênio, talvez os magistrados não saibam, é um elemento químico de símbolo O, número atômico 8 (8 prótons e 8 elétrons) com massa atômica 16 u. 

Quando se estudava a inserção do § 6º ao art. 104 da Constituição de 1934, discutiu-se muito sobre a composição desse elemento na atmosfera terrestre, que representa 20% na sua formação. Essa é a mesma percentagem, um quinto, fundamental para manter os tribunais vivos, sem corporativismo, plenos de experiência e isso só é possível com a presença dos advogados. 

O elemento oxigênio é indispensável para a vida assim como o advogado é imprescindível para o Judiciário.

A oxigenação, a inibição ao corporativismo, a experiência, o conhecimento técnico jurídico, aferido pelo advogados no Exame da Ordem, são requisitos que não podem faltar nos tribunais e isso só é possível através do quinto constitucional. 

Um magistrado um tanto aborrecido, estranha a afirmação de que não há corporativismo entre os advogados e alinha uma série de motivações. Diz que não tem visto advogados competentes e de renome abandonar sua banca, que rende muito mais, para pleitear o cargo de desembargador. Assegura, que, ultimamente, só figuram nas listas para o quinto, advogados recém formados, sem experiência de vida, mas que desfrutam de bons relacionamentos com os colegas ou com a OAB; os advogados do quinto chegam aos tribunais mais cedo que os juízes que lutam nas comarcas por trinta ou mais anos.

Um advogado que participava do debate diz que uma análise mais aprofundada do tema, leva à conclusão de que o primeiro grau é todo ele formado exatamente por advogados, que se submetem ao concurso, mas, evidente, que outros tem o direito de optar para trocar a advocacia pela desembargadoria, depois de garantida sua vida econômico-financeira. Ademais, não é interessante sair da capital ou da cidade, onde se reside com a família, para enfrentar a dureza das pequenas comarcas do interior. A luta aí é mais adequada para os magistrados, pois mais proveitoso para o advogado é “pegar o bonde andando”, para poder fazer os reparos dos vícios dos juízes adquiridos nas comarcas e nas varas judiciais. 

Diz mais o advogado: juiz, no primeiro grau não tem gabinete, não tem assessor, não dispõe de carro próprio, é obrigado a substituir colegas, em comarcas distantes mais de 200 quilômetros, mudar de residência num período médio de dois anos. Assim, não se vê motivo para os advogados iniciarem sua atividade nessa situação. Há de ter alguém na retaguarda para reparar os defeitos, acumulados no curso da vida nas comarcas, e esse alguém é o advogado. 

Alguns juízes censuram os advogados, porque lembram de oxigenação somente nos tribunais, esquecendo-se de outros órgãos que precisam de oxigenação, a exemplo da OAB, da Procuradoria. Mas isso, é intriga de poucos, invejosos da situação dos advogados. 

Essa história de que os juízes passaram pela experiência na arte de julgar não se sustenta para justificar o monopólio da classe nos tribunais; afinal, o atual presidente do STF, coincidentemente originado do quinto, disse que “a arte de julgar pode sim ser exercida por todos que se disponham a distribuir Justiça com retidão, altivez, coragem e autonomia”. 

Assim, nada mais justo que aumentar a oxigenação nos tribunais, reparando a omissão de governantes que seguiram ao presidente Getúlio Vargas, mas que nada melhoraram no sistema; governante nenhum terá coragem de retirar esse privilégio concedido a um grupo tão organizado; então, deve-se aperfeiçoar o instituto e incluir além dos advogados e promotores, também os defensores públicos e os delegados de polícia; afinal, todos, promotores, advogados, defensores e delegados não pertencem à mesma família, não lutam pela mesma causa, não perseguem o mesmo ideal? De forma que, para ser justo e em perfeito acordo com a manifestação do Presidente do STF, no sentido de que “a arte de julgar pode sim ser exercida por todos…”, indispensável dobrar para dois quintos, fixando em 40% as vagas dos “oxigenadores”, destinando 10% para cada segmento: 10% para promotores, 10% para defensores, 10% para advogados e 10% para delegados. Aí, não resta dúvida, a oxigenação será maior. Mesmo assim, o magistrado continuará com larga vantagem, pois abocanhará mais da metade das cadeiras dos tribunais. 

Um advogado explica que os magistrados imiscuem na economia interna da OAB e é preciso acabar com isso. A primeira providência já está no Congresso através de uma Emenda Constitucional, que retira dos desembargadores o poder de escolher três dos seis nomes escolhidos pela OAB. Essa ingerência não pode nem deve continuar, pois é muito poder conferido aos magistrados; nós, os advogados escolheremos e mandaremos diretamente para o executivo que indicará e nomeará um dos três nomes. 

Para vingar dos advogados, os magistrados lutaram e já foi aprovada pela Comissão de Constituição e Justiça da Câmara dos Deputados, uma Emenda, na qual se estabelece uma exigência para os advogados tornarem-se desembargadores ou ministros: arguição técnica para uma banca examinadora aferir a competência do pretendente. 

Os juízes cometem infâmia contra a classe dos advogados, quando defendem essa Emenda Constitucional, pois o Exame da Ordem avalia, mais adequadamente, os conhecimentos técnico-jurídicos do que mesmo o concurso público, instituído exatamente para acabar com essa arguição de falta de capacidade técnica; aliás, o Exame da Ordem, avalia, com mais rigor o conhecimento técnico-jurídico, do que os concursos públicos. O argumento, portanto é imprestável e casuístico. 

Os advogados não ficam atrás e dizem que a Emenda da escolha dos três nomes é que vai passar, pois o Congresso está cheio de bacharéis que apoiam suas demandas; e mais, poderemos exigir o Exame da Ordem para os magistrados que deixam a carreira para advogar. 

Afrontam a classe, quando afirmam que advogado é para defender ou para acusar sem perceber que quem sabe acusar e defender está mais preparado para julgar, porque, compreende melhor o que sente o autor e o que sente o réu. O juiz não passa por essa indispensável experiência para julgar. O juiz é só juiz, não pode comerciar, não pode fazer nada mais que não seja julgar. E isso de fazer a mesma coisa a vida toda, emperra o raciocínio. 

Assim, não se vê com estranheza a política de cotas nos tribunais, pois elas existem em vários segmentos, a exemplo das cotas raciais, a cota nas universidades, nos concursos públicos, a cota mínima para participação da mulher no Poder Legislativo, a que beneficia pessoas com deficiência. Vem mais cotas por aí: a cota dos baixinhos, a cota dos ateus, a cota das gordinhas. 

Salvador, 16 de novembro de 2014.

Antonio Pessoa Cardoso.

Ex-Corregedor - PessoaCardosoAdvogados

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