Odilon de Oliveira é juiz federal, que se destacou por atuar com muita coragem contra o crime organizado na fronteira do Paraguai, em Ponta Porã, Mato Grosso do Sul. O magistrado é de família pobre e trabalhou na roça até seus 17 anos. Formou-se pela Faculdade de Direito aos 29 anos. Foi procurador autárquico federal, promotor de Justiça e juiz de Direito, desde o ano de 1987.
Trabalhou em Mato Grosso, Rondônia e Mato Grosso do Sul. Assumiu a comarca de Ponta Porã, no Mato Grosso, em junho de 2004, onde permaneceu até o ano de 2005 e confessa ter sido a fase mais intensa de sua vida.
Jurado de morte pelos traficantes, chegaram a pagar para vê-lo morto R$ 1.5 milhão. Essa situação deixa o juiz em cárcere privado sob o controle de um mínimo de 7 (sete) agentes federais. Esse número já chegou a 10 (dez), por ocasião da formatura de um dos seus filhos.
A comida do juiz, quando estava em Ponta Porã, era problema para seus auxiliares diretos, pois o temor era muito grande de envenenamento.
O juiz diz que passou mais de ano na comarca sem ao menos conhecer a cidade. Para cortar o cabelo, o juiz tinha de vestir colete à prova de bala, acompanhado pelos seguranças. A única vez que foi a um shopping, um desconhecido tentou aproximar-se, mas os seguranças protegeu-o, afastando o cidadão, que depois, soube-se tratar-se de traficante. Residiu no quartel do Exército, em hotel e depois no fórum, em seu gabinete, onde tinha como mobiliário três beliches e uma televisão. Deitava-se cedo, sempre protegido por agentes de segurança, vez que tinha sofrido dois atentados e sempre recebia ameaças de morte, por telefonemas, cartas anônimas e avisos mandados por presidiários; acordava pela madrugada para produzir sentenças e mais sentenças, resumo de sua vida.
De seu bunker, auxiliado por funcionários que trabalhavam até alta noite, disparava sentenças, a exemplo da que condenou o mega traficante Erineu Domingos Soligo, o Pingo, a 26 anos e 4 meses de reclusão, mais multa de R$ 285 mil e o confisco de R$ 2,4 milhões, resultantes de lavagem de dinheiro, além da perda de duas fazendas, dois terrenos e todo o gado; Carlos Pavão Espíndola, condenado a 10 anos de prisão e multa de R$ 28,6 mil; o mega traficante Carlos Alberto da Silva Duro, 11 anos, multa de R$ 82,3 mil e perdeu R$ 733 mil, três terrenos e uma caminhonete. Aldo José Marques Brandão, 27 anos, mais multa de R$ 272 mil, e confiscados R$ 875 mil e uma fazenda.
Doze réus foram extraditados do Paraguai a pedido do juiz, inclusive o “rei da soja” no país vizinho, Odacir Antonio Dametto, e Sandro Mendonça do Nascimento, braço direito do traficante Luiz Fernando da Costa, o Fernandinho Beira-Mar.
Condenou 114 traficantes a quase 1.000 anos de cadeia, além de ter sequestrado em torno de 85 fazendas, 370 imóveis, 18 aviões, 600 veículos e 14 mil cabeças de gado, o que representa aproximadamente R$ 2 bilhões.
“As autoridades paraguaias passaram a colaborar porque estão vendo os criminosos serem condenados”, diz o magistrado.
A mulher e filhos moravam em Campo Grande, e seu deslocamento para encontrar com a família só acontecia de 15 em 15 dias, bastante protegido por seguranças.
Entre os anos de 2006 e 2009, na condição de corregedor do presídio federal de segurança máxima de Campo Grande, mandou algumas vezes Fernando da Costa, Fernandinho Beira-Mar, para o RDD, Regime Disciplina Diferenciado.
Mudou-se para Campo Grande, onde é titular da única vara especializada no processamento dos crimes financeiros e de lavagem de dinheiro, com jurisdição em todo o Estado.
Em sua casa espaçosa, onde vive com a mulher e dois dos três filhos, tem um quarto exclusivo para agentes federais.
O juiz não se intimida com as ameaças e não se rende a apelos da família, que quer vê-lo longe desse barril de pólvora.
JUIZ TEME PELA SEGURANÇA, QUANDO APOSENTAR
Odilon teme pela sua segurança e da família, quando aposentar, porque os riscos são grandes; diz que trocou sua liberdade “pela defesa da sociedade. Assim sendo, o Brasil não pode me descartar, como roupa velha, jogando-me à disposição dos malfeitores de quem confisquei tanta riqueza, processei, condenei e coloquei na prisão durante décadas”.
Em entrevista para um jornal sobre o crescimento do crime organizado, diz o juiz: “Nós já tivemos casos no Brasil de envolvimento de juízes. Esses dias foi preso um juiz em Minas Gerais, envolvido com tráfico de drogas. Então o sujeito entra na magistratura e não tem aquela formação para ser juiz, às vezes muito mais pela ambição do salário, pela ambição do poder. São diversas maneiras pelas quais as organizações se infiltram nos poderes, legislativo, judiciário e o executivo. A corrupção no Brasil é muito grande, o que mais cresce no Brasil é a corrupção. A corrupção, de 2006 prá cá, já cresceu 700%.
O juiz mostra-se decepcionado com a Justiça no Brasil. Informa que 23% do trabalho da Polícia Federal é dedicado ao combate à corrupção e 15% na luta contra as drogas. Cita como exemplo o fato de a legislação prever para o tráfico a pena de 5 (cinco) a 15 (quinze) anos de prisão, independente da quantidade de droga, ou seja 10 (dez) quilos ou 10 (dez) toneladas implica na mesma pena de 5 (cinco) ou 5,5 (cinco anos e meio) de cadeia. A mesma situação ocorre nos crimes financeiros, pois se a pessoa mandar para o exterior R$ 10 mil ou R$ 10 milhões a pena termina sendo quase a mesma. Afirma que a legislação brasileira é uma grande hipocrisia e só contribui para incentivar o grande crime. Diz que a justiça penal brasileira atende prontamente os ricos, para beneficiá-los, mas atende prontamente os pobres, para deixa-los na cadeia.
Salvador, 23 de novembro de 2014.
Antonio Pessoa Cardoso
Ex-Corregedor - PessoaCardosoAdvogados
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