sábado, 14 de fevereiro de 2015

JUIZADOS ESPECIAIS NÃO SÃO MAIS AQUELES!

Os Juizados Especiais de Pequenas Causa perderam suas principais características quais sejam, a celeridade, a informalidade, a oralidade, a simplicidade e a gratuidade. A alteração promovida pela Lei 9.099/95, que criou o Juizado Especial Criminal, aumentou o valor da causa e ampliou bastante a competência do sistema informal, causando o desvirtuamento o sistema informal.

Com tudo o que se fez de negativo, Relatório do CNJ, “Justiça em Números” 2014, mostra que 27% de todos os 78% dos processos judiciais, que tramitam na Justiça estadual, são direcionados para os Juizados Especiais. Mas a proporção de julgadores em um e outro sistema não guarda a mesma dimensão. 

Essa queixa da sobrecarga do sistema era previsível, desde que as modificações à Lei 7.244/84, ampliou o número de reclamações nos Juizados, fugindo da originalidade de atendimento às causas simples para receber as complexas, da permissão de acesso somente à pessoa física para atender à pessoa jurídica, do uso da lei especial, substituída pelo processamento das reclamações com o uso sistemática do CPC. 

As inovações danosas não pararam, pois no Congresso Nacional tramitam quase 200 projetos de toda natureza, grande parte deles para inchar ainda mais a competência do sistema dos Juizados Especiais. O Projeto de Lei n. 5.741/2013 pretende instituir nova instância nos Juizados, criando uma Turma Nacional de Uniformização, contribuindo dessa forma para atrasar na solução final das reclamações, além de instalar a complexidade, talvez superior a que já existe na Justiça comum, porque estabelecidos cinco degraus de jurisdição. 

Insatisfeitos com o aumento de alçada de 20 para 40 salários mínimos, há projeto, apreciado pela Comissão de Constituição e Justiça, aumentando o valor das causas para 80 salários mínimos. 

O processo criminal, aparecido em 1995, com a Lei 9.099, já sofre de alterações eleitoreiras, pois, se aprovado o Projeto de Lei n. 7.222/2010, os crimes punidos com pena não superior a 5 anos, passarão a integrar o rol de delitos de menor potencial ofensivo, em torno de 100 tipificações, anotadas no Código Penal e, portanto, passarão a serem processados no Juizado Especial Criminal. 

O legislador busca toda forma para expandir a competência e acesso no sistema e o magistrado não obedece à Lei 9.099/95, em muitos momentos, a exemplo da aplicação sistemática do Código de Processo Civil, contribuindo para desvirtuar o procedimento especial. Até a denominação passou a ser de Vara do Sistema dos Juizados Especiais, acompanhando em tudo a Justiça comum. 

Em 1999 apareceu a primeira exceção, para incluir a pessoa jurídica, no rol de causas de competência do Juizado, através da Lei n. 9.841, Estatuto da Microempresa e da Empresa de Pequeno Porte. Mais adiante, a Lei complementar n. 123/06 revogou expressamente a Lei n. 9.841/99, mas manteve a legitimidade ativa da microempresa. Outra Lei de n. 12.126/09 alterou o art. 8º da Lei n. 9.099/95, admitindo possam figurar na relação processual as organizações da sociedade civil de interesse público e as sociedades de crédito ao microempreendedor, transformando o sistema em “balcões de cobrança”. Empresas com faturamento bruto de até 2.4 milhões/ano passaram a ter acesso aos Juizados para reclamar dívidas dos antigos destinatários, sem despesa alguma. A busca tornou-se tão grande que alguns estados criaram varas das microempresas para deleite dos “cobradores de luxo” e tristeza dos devedores do lixo. 

E não pararam aí os desvirtuamentos da “Justiça dos pobres”. Em dezembro de 2009, a Lei n. 1.253 instituiu os Juizados Especiais da Fazenda Pública, obrigando os tribunais a instalarem esse novo órgão para agrado do Estado. Criou-se Juizados, nos aeroportos, destinados a solucionar às reclamações originadas dos usuários dos transportes aéreos. Interessante é que jamais lembraram dos danos, consistentes no descumprimento de horários, nas longas paradas em viagens intermunicipais, na perda de bagagem, dos serviços rodoviários. 

Na Exposição de Motivos, o ministro da Desburocratização e criador dos Juizados Especiais de Pequenas Causas, Hélio Beltrão, expunha os motivos à Lei 7.244/84, antecessora da Lei n. 9.099/95:

“O Juizado Especial de Pequenas Causas objetiva, especialmente, a defesa de direitos do cidadão, pessoas físicas, motivo pelo qual somente este pode ser parte ativa no respectivo processo. As pessoas jurídicas têm legitimidade exclusiva no polo passivo da relação processual”. 

O principal objetivo do sistema, dirimir pequenos conflitos, consistentes em contrariedades, desentendimentos entre vizinhos, causas sem complexidade, entre pessoas físicas hipossuficientes, fundamentalmente pela conciliação ou, se inexitosa, por um procedimento oral, simples, informal, célere e gratuito, foi aos poucos desaparecendo e hoje as demandas nos Juizados atendem mais às empresas do que aos pobres. 

Os tribunais centralizaram a “Justiça do Pobre” nos bairros ricos, acabaram com o atendimento noturno, dificultando o acesso do trabalhador, que se obriga a perder horas de trabalho para fazer queixa; além disso, complicaram a simplicidade de todo o sistema, inclusive das Turmas Recursais, quando extinguiram-nas no interior e criaram a mega estrutura de um Tribunal para apreciar recursos, contrariando a lei: “o recurso será julgado por uma turma composta de três Juízes togados, em exercício no primeiro grau de jurisdição, reunidos na sede do Juizado”. 

O Judiciário, pouca importância dedica à Lei 9.099/95, porque violam-na inclusive para aplicar o Código de Processo Civil, que só deve ser solicitado em caráter subsidiário. 

Todas essas alterações provocaram a lerdeza do sistema para solucionar demandas que antes demoravam 30 dias e agora passou para anos, caindo dessa forma na vala comum da Justiça ordinária. 

O desembargador gaucho, Luiz Melíbio Machado disse muito apropriadamente:

“A maioria das pessoas passa a vida sem ter uma grande causa, mas não passa um dia sem enfrentar mil contrariedades”. 

De Dubai para o Brasil, em 14 de fevereiro de 2015.

Antonio Pessoa Cardoso.
PessoaCardosoAdvogados.

Nenhum comentário:

Postar um comentário