sábado, 25 de abril de 2015

OS CARTÓRIOS EXTRAJUDICIAIS: UM LIXO.

O Judiciário na Bahia é um inferno, um caos, um barril de pólvora e pede socorro. Essas foram expressões que manifestamos em vários momentos, na condição de Corregedor e no nosso BLOG; elas retratam a situação dos cartórios judiciais, mas o cenário dos extrajudiciais é bem pior e não se consegue imaginar a desarrumação, mantida pelo Tribunal de Justiça, responsável pela administração de 90% deles, porque sem delegatários, que transtorna a vida do jurisdicionado, do servidor e do juiz. E esse quadro já dura muitos anos e não se concebe substancial mudança, mesmo com o resultado do concurso em andamento.

O serviço oferecido é precário, porque minguada a assistência do Tribunal no ambiente de trabalho: os cartórios funcionam em quartos escuros, em antigas e malcheirosas garagens ou banheiros, sem espaço, com infiltrações, gambiarra na parte elétrica, sujos, infectados pela poeira, cupins, baratas e ratos; a falta de material humano emperra a produtividade; cada cartório dispõe de um, dois servidores, quando seriam necessários sete para entrância inicial, e nove para entrância intermediária, de conformidade com o art. 214 da Lei de Organização Judiciária de 2007; no cartório falta material de expediente, a exemplo de tinta e papel para impressoras, de selos; as mesas, cadeiras e armários estão desgastadas pelo tempo, tornando-se inadequadas para uso; a internet é instável e inapropriada para a atividade; não há segurança no trabalho e o servidor enfrenta agressões verbais e até físicas; enfim, é escassa toda a infraestrutura mínima para atendimento aos “patrões”, consubstanciados no cidadão que paga para ter bons serviços.

É triste, mas real, porque visualizamos as ocorrências aqui narradas, concretizadas, por exemplo, em senhoras à beira da aposentadoria, sozinhas, movimentarem-se, no quarto de casas velhas, onde funcionam os cartórios, com a condução de livros pesados e estragados da mesa para o armário, deste para a mesa, lesando sua coluna. 

Diante desse sinistro, é irritante enquadrar-se com a tabela de custas, reajustadas em 300%, sem melhoramento algum na operação; as tarefas são cumpridas com morosidade excessiva e incompleta, porque, em muitos momentos, a busca de uma certidão torna ineficaz a labuta, simplesmente pela inexistência de registro, da matrícula sem número, ou das folhas dos livros, transformadas em papel picado, que o servidor guarda em sacos de plástico, estragadas pelos bichos, que emporcalham a sala onde funciona o cartório. Atuamos para a celebração de convênio, em maio/2013, entre o Tribunal de Justiça, as Corregedorias e o Mosteiro de São Bento, para restauração de 1,7 mil livros, nos próximos cinco anos; todavia, a providência chegou muito tarde e sem condições de recuperação da história, além da lentidão do trabalho técnico. 

É um inferno, é um lixo, onde o cidadão é torturado pela espera inconsequente e o servidor é explorado pelo trabalho escravo; trabalham e não recebem a remuneração correspondente à ação desenvolvida. São máquinas de trabalho, porque pressionados para substituir o ofício de muitos servidores em dois ou até três cartórios. Onde já se viu um servidor responder pelo cartório de Registro Civil de Pessoas Naturais e pelo cartório de Registro de Imóveis? Em Serra Preta, comarca próxima de Ipirá, registra-se essa excrescência, que não é isolada. 

E o servidor, que sozinho tem de fechar o cartório para ele próprio efetuar o recolhimento do DAJ, porque o fórum funciona num galpão, abandonado por uma grande empresa, em bairro, distante de outro, onde estão os bancos e o centro comercial? Isso ocorre em Sobradinho.

Os juízes, coitados, mesmo sentindo a dureza da decisão, são obrigados a designar um escrevente, um oficial de Justiça, sem treinamento algum, para exercer a função do delegatário que não veio; nesse esquema, o servidor é forçado a aceitar a determinação judicial, porque é ameaçado de sindicância e passa a enfrentar os maiores desafios de sua vida, enquanto o juiz é cobrado pelo Tribunal e pelo CNJ. Nada disponibilizam para minorar as dificuldades do servidor que não tem a quem recorrer, mas sacrificam a saúde e a família pelo temor de perder o emprego. 

Nem se diga sobre os cartórios de Registro Civil com funções Notariais; operam nas residências dos servidores ou, por economia, transferidos para a sede da comarca, distante até 80 quilômetros, como é o caso de Ourolândia, distrito de Jacobina. Constrange o cidadão a deixar sua casa, andar 80 quilômetros para fazer o registro do nascimento do filho, o registro do óbito de um parente ou mesmo para obter uma certidão qualquer. 

Até os cartórios de grandes cidades, a exemplo de Vitória da Conquista, provoca a necessidade de enfrentar a madrugada no sacrifício das filas para obter a prestação de um serviço cartorário. 

Nem se alegue desconhecimento desses fatos, porque nas visitas que fizemos a todas as comarcas da Bahia, noticiamos ao Tribunal e ao CNJ, mas não se tomou providências e sempre deixando para o próximo resolver.

Mas o servidor continua sendo o anteparo da revolta popular que não entende como aumentar os custos dos serviços judiciários em 300% sem oferecer nenhum benefício.

Só o cartório de Registro Civil registra o recém nascido ou o óbito ou o casamento; só o Tabelionato reconhece a firma ou transcreve o documento do imóvel; só o Cartório de Registro de Imóveis registra o bem que se possui. É o monopólio do desserviço, do transtorno.

Pois é assim no Judiciário. Nem se fala do sofrimento físico dos servidores: a servidora que tem caixas de medicamentos, na gaveta de sua mesa, para, de vez em quando, abrir e retirar um comprimido, apanhar um copo com água e tomar o remédio. Ninguém sabe que ela engoliu um comprimido para diminuir o estresse e ter paciência com as justas cobranças, pois já nem acerta seguir a rotina do trabalho. Está nervosa e depressiva: não tem como atender e é obrigada a ouvir até impropérios, quando não agressões. 

E o pior de tudo é que o rumo trilhado pelo Tribunal não arrefece o panorama, mas piora, porque entende residir a solução no fechamento de comarcas, sem preocupação alguma com a dificuldade que cria para o cidadão. 

A tranquilidade com o exercício da atividade que desempenhamos em 2012/2013, e, como gostaríamos que os colegas refletissem sobre isso, é a de que ouvimos o servidor, quando ninguém lhe dava atenção, e incutimos na sua mente a sensação de dever cumprido. 

Salvador, 24 de abril de 2015.

Antonio Pessoa Cardoso
PessoaCardosoAdvogados.

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