terça-feira, 2 de junho de 2015

SEGREDO DE JUSTIÇA

A juíza Andréa Pachá, do Rio de Janeiro, narra no livro “Segredo de Justiça”, da Editora Agir, sínteses de episódios colhidos nas reais situações vividas nos julgamentos de demandas numa Vara de Família. Tem pela frente a opção de diminuir as dificuldades da vida de dois que termina respingando num terceiro e num quarto. 

De maneira inteligente mostra que o juiz, para solucionar tais demandas, não pode nem deve ficar atrelado ao rígido procedimento anotado na lei de ritos, principalmente quando envolver menor no desentendimento entre os pais. Aponta o despreparo que o casal tem na educação dos filhos no jogo do amor. 

À ação requerida pela esposa, motivou a explicação do esposo de que tem muito dinheiro retido com o patrão e a prisão só complicaria a vida da mãe e dos filhos. Fugindo ao caminho processual, a juíza manda ele ligar para o patrão, dizer que estava em audiência e esclarecer as opções: cadeia ou pagar a pensão. A juíza, fora do contexto judicial, pediu o telefone e falou com o patrão: “É a juíza falando. O Chicão me disse que, se receber o salário, ele pode pagar a pensão. É verdade isso?” Duas horas depois o dinheiro chegou ao fórum e tudo foi resolvido. 

Usa, no livro, expressões fáceis de ser entendidas, bem diferente do juridiquês, em períodos curtos e certeiros para mostrar a incúria do homem na busca da felicidade, que acaba misturando com o prazer. 

Com boa experiência na área, a magistrada explica o uso que muitos casais fazem da justiça, servindo de trampolim para aclarar um relacionamento perto de ruir. Muitas mulheres e homens requerem ação de divórcio ou mesmo de alimentos unicamente para testar o sentimento do parceiro. Extingue-se a ação, porque, verdadeiramente, não buscavam o divórcio e muito menos alimentos, mas focavam segurança nos caprichos alimentados de um para com o outro. 

Questiona o aumento de interdições, originadas de doenças, Alzheimer, principalmente, e velhice. Indica a superioridade do amor às dores e aos problemas.

O pai, 86 anos, motivo de interdição, era professor e pesquisador de matemática e, logo ao chegar à sala de audiência, diz para a juíza: “O triste de envelhecer é que a gente vai perdendo todo mundo pela vida, Excelência.” Os abusos são cometidos, através dos empréstimos consignados, das aplicações indevidas, dos furtos e dos maus-tratos. Não era o caso de Djalma e Evandro.

Andréa insurge-se contra a indústria da pensão alimentícia: “Quando vejo uma mulher qualificada profissionalmente, em idade produtiva, receber pensão de ex-marido, confesso que sinto um desconforto. Não consigo imaginar que tipo de vinculo pode gerar essa obrigação. Casamento não é emprego.”

Esclarece sobre o muro separatório entre o cidadão e o juiz: “Eu quero usar o meu direito constitucional de ser recebida pela juíza”, disse-lhe uma senhora. O “acesso à justiça, quando meramente formal, não resolve nada. Mas ver respeitado o direito à informação pode diminuir a sensação de injustiça.”

Pachá, corajosamente, assegura que suas experiências e seus valores morais não servem de balizamento para fundamentar suas decisões. 

Um bom livro para indicar o largo caminho para um julgamento encerrado no amor que se desfez. 

Salvador, 2 de junho de 2015.

Antonio Pessoa Cardoso.
PessoaCardosoAdvogados.

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