segunda-feira, 7 de setembro de 2015

DELAÇÃO PREMIADA

O instituto da delação premiada está previsto em várias leis e cada uma fixa requisitos para sua concretização, dentre as quais: a Lei n. 8.072/90, dos Crimes Hediondos; a Lei n. 9.807/1999, Proteção à Testemunha; a Lei n. 9.613/98, alterada pela Lei n. 12.683/2012, conhecida por Lei de Lavagem de Dinheiro; a Lei n. 11.343/2006, que instituiu o Sistema Nacional de Políticas Públicas sobre Drogas; a Lei n. 12.850/2013, que define a organização criminosa e dispõe sobre a investigação criminal. Todo esse ordenamento jurídico, e muito mais, inclusive o Código Penal, quando trata do crime de extorsão mediante sequestro, buscam aprimorar os instrumentos para punição dos criminosos envolvidos em grandes organizações direcionadas para o crime. 

A Lei 12.850/2013 garante “o perdão judicial e a consequente extinção da punibilidade ao acusado que, sendo primário, tenha colaborado efetiva e voluntariamente com a investigação e o processo criminal, desde que dessa colaboração tenha resultado: I – a identificação dos demais co-autores ou partícipes da ação criminosa; II – a localização da vítima com a sua integridade física preservada; III – a recuperação total ou parcial do produto do crime...” 

O instituto comporta a divisão em: colaboração premiada sem delação, na qual o denominado colaborador assume a culpa do evento criminoso, sem incriminar outras pessoas; a colaboração premiada com delação, na qual o colaborador assume a culpa e delata outros criminosos, classificando, neste caso, de delação premiada.

O favor premial não é recente, pois já se utilizava na afixação de cartazes em lugares públicos com o nome e foto do criminoso, quando se estabelecia uma recompensa para eventuais informações que levassem à prisão da pessoa procurada. A denúncia anônima, principalmente, nos crimes de sequestros, constitui-se eficaz ajuda para a prisão de bandidos, e tem merecido aplausos até mesmo dos empresários, porque responsáveis pelas descobertas de assaltantes pés de chinelo. 

A delação premiada é uma recompensa do Estado para o acusado de crime, no qual há confissão e incriminação de terceiro; objetiva captar informações para a persecução do crime; destrói a “ética” usada entre os criminosos, que consiste na fidelidade ao companheiro delinquente; esse descaminho da “lealdade” funda-se na ameaça e temor de ser morto, caso denuncie. O ladrão ou o corrupto, quando preso, confia no poder dos companheiros para impedir sua condenação. Assim, a delação aparece para fazer o bem para a comunidade, pois o delator abandona a organização criminosa, além de oferecer documentos e informações sobre a entidade a qual pertenceu, facilitando o caminho para desmantelamento da organização criminosa e prisão dos participantes. 

A Itália chamou a atenção do mundo, na operação Mãos Limpas, que se deu nos anos 1990, acerca de pagamentos de subornos entre políticos e empresários em Milão. Foi desbaratada uma das maiores organizações criminosas do mundo, a Máfia, que acabava com vidas de pessoas inocentes, sem a mínima piedade. A vitória desse movimento deve-se à ajuda dos criminosos que “entregaram” seus comparsas à Justiça. A partir daí o Código Penal e outras leis italianas trataram da delação. 

Os Estados Unidos adotam a colaboração com a justiça, através do plea bargaining, comandada pelo Ministério Público, que possui discricionariedade para conduzir a investigação policial, propor a ação, fazer acordos e negociar a pena; mais de 80% dos crimes, nos Estados Unidos, são solucionados por essa forma. 

Diferentemente do que ocorre no Brasil, o plea bergaining concede imenso poder ao Ministério Público que termina atropelando a ampla defesa e muitos princípios constitucionais, porque a função prioritária do direito penal é zelar pela paz da sociedade. 

O direito espanhol, contempla a delação premiada através do “delincuente arrependido”, no Código Penal; da mesma forma, o Código alemão trata da “clemência”, sempre no interesse maior da comunidade contra o crime. Outras legislações projetam esse primoroso instrumento para obter a paz.  

Os avanços tecnológicos proporciona condições para crescimento e sofisticação do crime organizado, que já não tem fronteiras de atuação, tornando mais custosa a neutralização de seus movimentos, vez que vinculado ao terrorismo com apoio logístico e financeiro, capaz de desestabilizar política e economicamente um país. 

O novelo arquitetado pelos cartéis da droga, pelos terroristas e pelos corruptos é apreciável meio para ganhar dinheiro, encalhado somente depois que se contou com a arma, indigesta para essas organizações; atinge a política e a economia do país. A Petrobrás, orgulho do povo brasileiro, caminhava para completa destruição e os recursos que estão sendo recuperados mostram bem para onde nos levavam. 

O Brasil segue tendência mundial no combate ao crime organizado e insere na legislação pátria essa possante ferramenta para prender os corruptos no meio político e no ambiente das grande empresas, influentes nos destinos do país e donos de grandes riquezas; o delator, que oferece informações preciosas para desmantelamento da organização criminosa, recebe benefícios; somente assim, somos capazes de estancar a saída de volumosos recursos das empresas estatais, direcionados para aumentar o poder dos inescrupulosos homens públicos e para o crescimento dos corruptos empresários, além de proporcionar significativo luxo para suas famílias.

A crítica acerba ao instituto, originada de alguns juristas, não procede, porque nos tempos atuais os criminosos aperfeiçoam seus “instrumentos de trabalho” e não é justo que continuemos seguindo as orientações burocráticas dos célebres acadêmicos, enfurnados mais nas suas teses abstratas do que abertos para criação de novas armas para extinguir com as organizações criminosas.

As bancas de advogados tem mostrado resistência ao instituto, assegurando que se trata de incentivo institucional à caguetagem ou ao dedo-durismo; todavia, não há como a sociedade ceder e optar pelas teses acadêmicas e abandonar o combate seguro contra a violência e a corrupção, usando arma já difundida nos maiores países do mundo. 

Afinal, essa gente dispõe do poder e de força para ameaçar eventuais movimentações de processos lentos e cheios de princípios burocráticos, incumbidos de dificultar os julgamentos e as condenações. Eles progridem com os instrumentos utilizados para o crime e o Estado mantém-se estático servindo somente de mecanismos que se mostram ineficientes para aniquilar com as avantajadas perfeições do crime organizado.

Não se trata de traição de pessoas, mas de desmanche da ética ajustada entre criminosos para esconder o roubo e continuar dilapidando o patrimônio do povo em benefício de suas empresas e de suas famílias. Os delatores arrependem-se, aniquilam com a organização criminosa e recuperam para o Estado volumosos recursos que de outra forma não seriam resgatados. 

O STF em algumas oportunidades decidiu pela constitucionalidade da delação premiada e considerou expediente de grande utilidade para a investigação.


Salvador, 07 de setembro de 2015.

Antonio Pessoa Cardoso.
Pessoa Cardoso Advogados.

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