O cidadão tem o direito de arrependimento “sempre que a contratação de fornecimento de produtos e serviços ocorrer fora do estabelecimento comercial, especialmente por telefone ou a domicílio”, art. 49 Código de Defesa do Consumidor; se a compra efetivou-se, mesmo na loja do fornecedor, sem que o produto estivesse exposto na loja, a jurisprudência tem admitido a cláusula de arrependimento.
Não temos lei que trata especificamente do comércio eletrônico, mas aplicável os artigos 33 e 49 do CDC. O art. 33 diz que nesses contratos “...deve constar o nome do fabricante e endereço na embalagem, publicidade e em todos os impressos utilizados na transação comercial”. As modificações ao Código de Defesa do Consumidor tratarão dessa matéria como se verá adiante.
A jurisprudência do STJ, 3º Turma, admite arrependimento também de empréstimo bancário, desde que contratado fora das instalações do banco. O Tribunal de São Paulo não aceitou aplicação do CDC, mas a Súmula 297 entende aplicável a lei do consumidor às instituições financeiras.
Não há limitação ao exercício do arrependimento no caso de prestação de serviço e isso causa transtornos, quando a obra contratada já tenha sido executada.
No direito comparado, verifica-se que a lei brasileira não se mostra adequada na previsão de todas as hipóteses acerca do direito ao arrependimento, mesmo porque está contemplada por apenas um artigo e um parágrafo.
O direito de “reflexão”, existente nos países da União Européia, França, Alemanha, Portugal, Itália, é admitido sob o argumento de que o consumidor não analisou o produto, nem testou o serviço contratado.
No direito português, há restrição ao arrependimento em função do contrato de prestação de serviço: obra contratada iniciada ou produtos fornecidos com especificações oferecidas pelo consumidor. No direito italiano, também há essa limitação. O motivo para esse procedimento é que o arrependimento refere-se ao contrato e não ao serviço iniciado ou concluído.
Outra omissão na nossa lei ocorre quando não obriga o fornecedor a prestar informação ao consumidor sobre o direito de arrependimento, diferente da lei portuguesa, Decreto-Lei n. 143/2001, que, sem esse informe, elastece o prazo de 14 para 30 dias.
O Código Civil, art. 187, é invocado para dirimir dúvidas sobre o abuso do direito de arrependimento, quando trata dos atos ilícitos; todavia, tem criado situações difíceis de serem solucionadas, porque estatui regra geral e não específica do consumidor.
O Projeto de Lei n. 281/12 tramita no Congresso Nacional e presta-se fundamentalmente para regular o comércio eletrônico; traz inovações, além de inserir nove parágrafos no art. 49, hoje com apenas um. Estabelece a obrigatoriedade para o fornecedor prestar informações ao consumidor sobre o direito de arrependimento, punindo-o, se omitida essa exigência; aceita o direito de “reflexão,” no caso de a mercadoria não está exposta na loja, sob o fundamento de que não teve o consumidor oportunidade para conhecer o produto ou serviço; contempla ainda a compra de passagens aéreas pela internet, apreciado pela jurisprudência, mas sem entendimento uniforme.
A compra no estabelecimento comercial suporta o arrependimento somente se o produto adquirido apresentar vício de qualidade ou quantidade não solucionáveis, desde que obedecido o prazo de 30 dias, art 18 CDC.
Além de muitos outros, o Projeto n. 625/11, na Câmara dos Deputados, concede o direito de desistência de uma compra, sem necessidade de motivação, embasado na justificativa de que normalmente, o consumidor está envolvido em abundantes e extravagantes publicidades, seguidas de sofisticadas técnicas de persuasão dos vendedores, além de métodos agressivos e abusivas; os próprios governantes estimulam o cidadão a consumir ao invés de instruir a poupar. O Projeto prevê o excesso contra o exagero do consumidor, admitindo o arrependimento desde que a mercadoria esteja nas mesmas condições do recebimento, inclusive com as embalagens originais e, no prazo de 48 horas.
O instituto do arrependimento é adotado em muitos países inclusive nos Estados Unidos, através da política denominada de “returns” ou “refunds”; as lojas aceitam a devolução do produto somente porque o consumidor mostrou-se insatisfeito com a compra; o prazo é de 30 dias e não é necessário o apontamento de defeito no produto.
Sem norma específica sobre a “reflexão” em compras nas lojas físicas, muitos fornecedores, no Brasil, no máximo, admitem a troca por outro produto ou oferecem crédito para utilização posterior na loja. Outros chegam a devolver o dinheiro ou trocar o produto, mesmo sem a existência de vício, porém como estratégia de marketing para fidelização do consumidor, sem se preocupar com amargura do cidadão.
Salvador, 25 de dezembro de 2015.
Antonio Pessoa Cardoso.
Pessoa Cardoso Advogados.
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