Os julgamentos nos tribunais obedecem a um ritual que se mostra esdrúxulo e fora do tempo. Os processos são sorteados para os desembargadores ou ministros, que se tornam relatores; quer-se com este sorteio partilhar entre todos os integrantes de cada câmara ou de cada turma igual número de recursos ou de processos originários. O relator, normalmente, através de seus assessores, analisam, estudam o feito, após o que se pede dia para julgamento e aí entra a esquisitice do ritual. O enorme poder conferido ao presidente para colocar este ou aquele processo na pauta. O absurdo desse cenário somente é notado nos tribunais que possuem muitos processos para julgamento, a exemplo dos tribunais superiores, onde um recurso pode permanecer por anos, aguardando a pauta do presidente.
No dia da sessão, os advogados manifestam e o relator lê seu voto, que pode, às vezes demorar horas; se o processo tiver revisor, este poderá também ocupar horas na leitura de seu voto; os outros membros fazem indagações ao relator para ao final pedir vista ou expor seu voto, aderindo ou discordando. São tantas as citações de nobres doutrinadores, que se imagina está em debates acadêmicos.
De acordo com o Código de Processo Civil, o desembargador ou ministro que pediu vista deve devolver o processo para julgamento no prazo de 20 dias, prorrogáveis por mais 20. Todavia, esse prazo ou a inclusão em pauta pelo presidente, dificilmente ocorrem com a presteza necessária, causando atraso nos julgamentos, principalmente pelo longo tempo que adormecem nos gabinetes dos desembargadores ou dos ministros até o dia em que resolvem pedir dia para julgamento.
Novamente o processo, que já teve o voto do relator e talvez do revisor, segue para o presidente incluir em pauta, que poderá ser na próxima sessão ou no dia que ele bem entender. Quem pediu vista vai ler seu voto que também pode demorar horas. O descompromisso com a agilidade dos julgamentos começa pelos ministros do Supremo Tribunal Federal ou com os tribunais que têm mais de 40 membros, a exemplo da Bahia com 59. A lei autoriza esses tribunais com mais de 25 membros a criarem um Órgão Especial com 11 ou até 25 desembargadores com competência para julgar os feitos que naturalmente são submetidos aos 59 membros. Há delegação do Pleno para o Órgão Especial para julgar os processos de competência do Tribunal.
Sem o Órgão Especial é lenta a movimentação dos processos nos tribunais, exatamente pelo método arcaico de julgamento, imagine-se um Tribunal com mais de 40 membros e a votação de todos esses componentes. Haja pedidos de vista!
No STF, Habeas Corpus que deveria ter, efetivamente, rito especial demoram anos para serem julgados com os sucessivos pedidos de vista.
O roteiro dos processos com pedidos de vista, frequentemente, é bastante torturoso. Um Habeas Corpus de um delegado de Polícia do Rio Grande do Sul foi ajuizado no STF em 2003 e presta-se para suspender sentença pelos crimes de tortura, homicídio e tentativa de homicídio. Sob a relatoria do ex-ministro Carlos Veloso, que se aposentou e passou o processo para o ministro Ricardo Lewandowski; entrou em julgamento em outubro/2006, mas a ministra Cármen Lúcia pediu vista; dois anos, em 2008, foi a julgamento e o ex-ministro Joaquim Barbosa pediu vista; um ano depois, em julgamento, o ex-ministro Ayres Britto pediu vista; para substitui-lo, o ministro Barroso recebeu e pediu dia para julgamento em 2015 e desde então encontra-se na presidência para designação de data para julgamento.
Os desembargadores e os ministros criam normas, mas não respeitam e nada acontece. Ademais, desobedecem até mesmo o Código de Processo Civil que fixa o prazo de 10 dias, com prorrogação de mais 10, para devolução dos processos com pedidos de vista, art. 940 CPC.
Por outro lado, o CNJ, através da Resolução n. 202/2015, fixou o mesmo prazo estabelecido na lei processual e determinou que, se o processo não for entregue tempestivamente, o presidente do órgão “fará a requisição para julgamento na sessão subsequente,…”.
Essa norma foi editada depois da vigência do Código de Processo Civil e para vigorar em todo o território nacional, mas os tribunais não obedecem e pedem vista e continuam devolvendo quando querem, contribuindo, dessa forma, para atraso no julgamento final dos processos.
O STJ alterou seu Regimento e fixou o prazo para devolução do processo com pedido de vista de 30 dias, prorrogáveis por mais 30 dias. A maioria dos ministros asseguraram que o STJ é quem fixa o prazo para devolução dos pedidos de vistas de seus membros, ignorando solenemente o dispositivo processual.
Salvador, 11 de dezembro de 2016.
Antonio Pessoa Cardoso
Pessoa Cardoso Advogados.
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