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segunda-feira, 24 de julho de 2017

DELEGAÇÃO DA ATIVIDADE JURISDICIONAL

O “Tribunal de Exceção” ou “Justiça de Crédito” é formada pelo SPC, Serviço Nacional de Proteção ao Crédito, pelo SERASA, Central dos Serviços Bancários S/A, pelo CNDL, órgão da Confederação Nacional de Dirigentes Lojistas, pelo CCF, órgão responsável pelo registro de cheques sem fundos, pelo CADIN, que armazena registro de devedores de tributos, pelo SCR, que analisa riscos de créditos, e outros órgãos dessa natureza. 

A “Justiça de Crédito” ou “Justiça de Exceção”, como a denomino, recebe grande número de “processos”, que são os boletos, títulos, cheques ou outros documentos não pagos pelo devedor. O que chama a atenção dessa justiça especial é o rito, porque totalmente diferente da Justiça convencional. Nessa Justiça, basta a comunicação de seu corpo funcional, alegando que o cidadão tal comprou e não pagou uma parcela ou o total da dívida para que, de imediato, seja aplicada pena ao infrator, consistente em inserir o nome do cidadão no cadastro, intitulado de “maus pagadores”. 

Um funcionário da “Justiça de Exceção” faz o apontamento e o cidadão, mesmo que não seja realmente devedor, passa a ser maltratado pelo comércio de todo o país, pelas financeiras e por prestadores de serviço. O castigo impede o cidadão de arrumar emprego, de tomar empréstimos, de fazer compras, de matricular o filho na escola, enfim, está com o nome maculado. Essa é a “sentença” da “Justiça de Crédito” e não há recurso, salvo se o devedor se dispuser a enfrentar a burocracia do Judiciário para pedir a retirada de seu nome. 

Apareceu agora novo sistema altamente danoso para o cidadão; trata-se de outra delegação do Judiciário para os bancos e financeiras, no sentido de poderem dirigir o procedimento para receber crédito, não pago por cidadãos que adquiriram um imóvel ou até mesmo para garantir empréstimos de dinheiro. As financeiras e os bancos desempenham o papel do juiz para cobrança das dívidas não pagas, sem necessitar de intervenção alguma do Judiciário. Trata-se do processo extrajudicial, originado dos contratos de Alienação Fiduciária de Imóveis. 

O processo extrajudicial, conferido ao próprio credor, bancos e financeiras, é maledicente com o cidadão, pois na sua originalidade, a Lei 9.514/1977, responsável por essa delegação, permite aos donos do capital fazer o processo movimentar-se com a intimação através de publicação de edital em jornais de grande circulação, como se o homem comum fosse obrigado a ler jornais. 

Essa lei oferece segurança às financeiras e desprotege os adquirentes de imóveis residenciais; a desproteção ao comprador de um apartamento ou casa consiste no processo extrajudicial, altamente danoso e desvantajoso para o devedor, que fica à mercê do credor, denominado de fiduciário, sem obrigação de obedecer a qualquer parâmetro nas etapas do processo, salvo o que lhe convém.

Essa maldita Lei 9.514/1997, através do instituto da Alienação Fiduciária, serviu para responder à grita dos bancos e das financeiras pela recuperação do capital nas construções, causados pela inadimplência do devedor de imóvel financiado, sem se importar com qualquer segurança ao adquirente da casa própria. Não pagou, o banco ou a financeira vai iniciar o processo, sem participação alguma do Judiciário, até acontecer a venda do imóvel em leilão. E o adquirente pode nem tomar ciência do fato, porque insistem em praticar os atos por edital. 

O objetivo maior dessa lei prendeu-se a evitar a lerdeza na execução judicial como era a hipoteca do imóvel, através de processo no Judiciário. Transformou-se de judicial para extrajudicial e aí vem o cometimento dos abusos, como se o consumidor fosse culpado da lerdeza do Judiciário, para merecer tratamento diferenciado e mais doloroso.

O pobre coitado que trabalhou toda a vida para adquirir um imóvel pode ser surpreendido com crises que se tornam comuns no país, atrasar dívidas, e perder o único bem que possui, sem interferência alguma do Judiciário; e o pior é que a venda em leilão pode implicar em valor ínfimo do imóvel e nada sobrar para o devedor, através de processo comandado pelo próprio credor. 

Veja o absurdo que se empurrou “goela abaixo” do adquirente de imóvel: na alienação de bens móveis, o carro, a moto e outros bens, Dec.-lei n. 911/69, o proprietário fiduciário, ou seja, a financeira ou o banco, deverá requerer ação judicial, busca e apreensão, para consolidar a propriedade do bem móvel, dado em garantia; nessa oportunidade, abre-se prazo para o devedor purgar a mora ou contestar a ação, após o que deve haver uma sentença, diferentemente do procedimento para tomar o bem imóvel, que é feito através de execução extrajudicial, ou seja, procedimento comandado pelos banqueiros e homens das finanças.

Salvador, 24 de julho de 2017.

Antonio Pessoa Cardoso
Pessoa Cardoso Advogados.

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