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domingo, 10 de dezembro de 2017

A PRESCRIÇÃO NOS CRIMES CONTRA A VIDA (II)

O índice de elucidação de autoria dos casos de homicídios, no Brasil, é baixíssimo, em torno de 8%, enquanto no Chile esse percentual é de 90%. Pesquisas de 2012, apontam o Chile com índice de criminalidade de 3,1% em cada 100 mil habitantes, o menor na América do Sul; na mesma pesquisa das Nações Unidas, o Brasil tem o percentual de homicídio de 25,2 por cada 100 mil habitantes. 

No ano de 1980, o número de homicídios, no Brasil, foi de 6.104, saltou, em 2012, para 40.077; em 2013, 53.646 de mortes violentas, homicídios dolosos, latrocínios e lesões corporais seguidas de morte. Em 2014, registrou-se 58.497 vítimas de mortes violentas, com aumento de um para o outro ano, de 37%. Em 2016, o quantitativo de mortos por homicídio subiu para mais de 61 mil pessoas que perderam a vida. 

O primeiro descaso com a apuração dos crimes de homicídio acontece por descuido do Executivo que não organiza a Polícia Civil com a estrutura mínima necessária. Os governantes não tem interesse em aparelhar a Polícia Civil e os prédios das delegacias são poluídos pela absoluta falta de higiene, com paredes sem pintura, goteiras, móveis quebrados e sem nenhum avanço tecnológico. 

As sedes de delegacias municipais, quando tem delegados não dispõem de máquinas, falta investigadores e até funcionário de apoio, a exemplo do escrivão. Cai sobre os ombros do Delegado a obrigação de acumular encargo e desempenhar a atividade administrativa, como a preparação dos boletins de ocorrências. E as deficiências não param por aí, pois terá de investigar, ouvir testemunhas, fazer perícias e encaminhar o indiciado para exame de corpo de delito; após todas essas providências, se conseguir trabalhar, terá de fazer relatório circunstanciado e remeter toda a papelada para o cartório, vez que não existe digitalização nas delegacias de polícia. Esse cenário causa repetição de diligências ou até mesmo anulação do inquérito. 

Ao chegar o inquérito policial ao Cartório Criminal um mês, seis meses, um ano depois, pode permanecer por meses e anos, nos armários dos cartórios, aguardando o oferecimento de denúncia pelo Ministério Público. Aí registram-se outras deficiências para investigação e punição do criminoso. As Comarcas foram desativadas e uma unidade passou a agregar até cinco municípios. Se tiver juiz nessa Comarca, composta por cinco municípios, não há promotor, nem defensor e muito menos servidor; as deficiências estruturais das delegacias são registradas também nos prédios dos fóruns. 

Depois de oferecida a denúncia, é o momento para chamar o réu, para responder ao processo. Com alguma frequência, o réu foi citado, mas não comparece e aí reside um cipoal de providências burocráticas que impedem a movimentação do processo, inclusive com a mudança de endereço do réu, constituindo outro obstáculo para o andamento do processo. Após tentativas para localizá-lo, só resta a intimação por edital. A sentença, a remessa para o Tribunal do Júri, o sorteio de 21 jurados e a seção do júri, se nada de anormal ocorrer, é a sequência do procedimento que retarda o julgamento. 

Se na capital falta estrutura para andamento dos processos de homicídio, imagine-se o que não ocorre no interior; registre-se que não há digitalização de processos criminais e tudo é feito artesanalmente. 

É muito comum o arquivamento de processos de homicídio pela ocorrência da prescrição. 

O Tribunal da Bahia, no ano de 2017, teve expediente durante 222 dias, considerando os enforcamentos de toda sexta feira ou terça feira que antecede ao feriado de quinta ou de segunda feira. Isso é oficial, de conformidade com Decreto Judiciário, publicado no dia 24/01/2017.

Os dois tribunais do Júri de Salvador realizam por ano, em media, 150 júris; sabendo-se que são registrados 1.400 homicídios com 150 júris, pode-se concluir que há julgamento de 11% dos homicídios, por ano. 

Analisando os números acima, na melhor das hipóteses, ocorrerão 150 julgamentos por ano. A média de crimes cometidos, em Salvador, situa-se em em 1.400 homicídios por ano. Se julgar 150 homicidas, e isso não se concretiza, todo ano restarão 370 homicidas sem julgamento.

Em dois anos acumularam 1.250 processos, juntando aos 4 mil do acervo anterior, temos um quantitativo de 5.250 processos; para julgar esses 5.250, os mesmas juízes e servidores terão de trabalhar até o ano de 2.052, sem considerar o amontoamento subsequente, contínuo e anual de processos.

A impunidade não é sentida só pela capital e região metropolitana, pois, em Feira de Santana, há uma Vara do Juri e 4.400 processos de crimes contra a vida. Se o juri tiver duas sessões por semana, como é costume, esses processos só serão julgados no prazo mínimo de 40 anos. Trabalham na Vara apenas três funcionários e seis estagiários. 

Salvador, 10 de dezembro de 2017.

Antonio Pessoa Cardoso
Pessoa Cardoso Advogados.

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