Nesse 11 de setembro, quando se comemorou 29 anos da edição do Código de Defesa do Consumidor, vale uma reflexão sobre o direito do consumidor.
O consumidor é mais prestigiado pela resiliência do que mesmo pelo respeito aos seus direitos. A realidade mostra que o Código de Defesa do Consumidor, na prática, não é obedecido, porque o governo, o fornecedor e o prestador de serviços usam artifícios para negar o que é concedido pela lei. Falta informação à parte mais fraca, frauda-lhe o direito na qualidade do serviço, engana-lhe na prevenção dos prejuízos e dificulta o acesso à Justiça.
A lei é pródiga, art. 5º do Código de Defesa do Consumidor, no oferecimento de meios para proteger o consumidor: manutenção de assistência jurídica; instituição de promotorias e defensorias; criação de delegacias de polícia especializada, de Juizados Especiais, de concessão de estímulos ao desenvolvimento das Associações de Defesa do Consumidor.
Na Bahia, a defensoria pública é precária, porque o governo não lhe oferece a estrutura necessária; o resultado dessa desatenção é que o consumidor, principalmente, no interior, não tem defensoria e se serve da boa vontade dos advogados que assumem a defesa gratuitamente. O governo do Estado vetou integralmente o Projeto de Lei n. 21.861/2016, que tratava do pagamento de honorários a advogados dativos e previa pagamento de honorários pelo Estado aos advogados dativos.
O consumidor recebe a garantia de segurança da informação, através da Constituição Federal de 1988, do Código de Defesa do Consumidor e de inúmeras leis e normas, mas, ainda assim, é explorado até mesmo pelas agências reguladoras, órgão do governo federal, que pouco fiscaliza e quase nunca pune.
A tentação para o consumo aumenta na medida em que cresce a onda tecnológica, com o aparecimento dos celulares, da informática, das redes sociais, dos robôs e de outros avanços que se prestam para até mesmo substituir o homem no mercado, provocando disparidades no mundo consumerista. Os benefícios são imensos, mas a criação de dificuldades para o consumidor torna-se grande, porquanto o norte dessas empresas cinge-se somente ao lucro desenfreado.
O conforto gerado pelas máquinas causa mudança impositiva na vida do cidadão que é forçado a seguir novos caminhos, com geração de violação ao seu direito. E aí não há ou são precárias as proteções aos consumidores.
A garantia do defeito do produto é propalada, mas quando o consumidor reclama seu direito aparece todo tipo de subterfúgio; a cobrança indevida, a negativação do nome descabida, o cartão de crédito que lhe chega sem ser solicitado, o plano de saúde que recusa em preservar a saúde ou que aumenta, ilegalmente, as parcelas, os juros extorsivos, os abusos das contas telefônicas, a água que não sai das torneiras, a energia paga e não fornecida, a venda de produtos com validade vencida, a propaganda enganosa, enfileiram-se no ultraje contra o consumidor.
Junte-se a esses dissabores, a certeza de que todos se escoram no Judiciário para negar ou postergar no atendimento às reclamações sobre as violações ao direito do consumidor. É que sabem ser a justiça lenta e por isso preferem o uso da expressão “vá procurar seus direitos”, diferente daquela que era usada, quando apareceram os Juizados Especiais: “eu te processo”.
A luta entre o capital e o trabalho foi sucedida nos tempos atuais pela batalha entre o prestador de serviço e o consumidor. E nesse campo, aquele leva ampla vantagem, pela própria superioridade do dinheiro sobre o direito. É lamentável chegar-se a esta conclusão, mas é a realidade do dia a dia do cidadão.
Os fornecedores de serviços continuam ditando as regras para a celebração do contrato e o pior é que contam com subsídios dos governantes que não têm pulso para impedir os juros abusivos, para inaceitar os aumentos da prestação dos planos de saúde em percentuais bem acima da inflação. Segundo dados da ANS, nos três últimos anos, em torno de 3 milhões de pessoas abandonaram os planos, porque o preço e o desemprego induziram a essa posição.
O desalento maior do consumidor reside na aceitação de que as relações humanas tornaram-se reduzidas a simples “nexo financeiro”, como dizia Carlyle no século passado.
Interessante é que os governantes e as empresas, verbal e formalmente, incentivam o consumidor a ser mais consciente nas compras, mas, nesse mesmo tempo, surrupiam do consumidor a boa prestação de serviço e saqueiam seus direitos.
Será que os call centers passaram a facilitar a vida do consumidor ou proporcionaram melhores ganhos para as empresas? As lojas, que vendem gêneros alimentícios, informam sobre a composição do alimento, mas será que cumprem com a retirada da venda dos produtos com data de validade vencida? Os bancos deixam o cliente esperar menos de quinze minutos nas filas dos caixas? As extensas bulas dos medicamentos simplificaram a informação dos remédios? Os hospitais atendem ao paciente sem caução, mesmo na emergência?
Infelizmente são perguntas com respostas que não agradam ao consumidor.
Salvador, 11 de setembro de 2019.
Antonio Pessoa Cardoso
Pessoa Cardoso Advogado.
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