domingo, 24 de maio de 2020

O TRF-6 E A DESOBEDIÊNCIA À DECISÃO JUDICIAL

A criação do Tribunal Regional Federal da 6ª Região, em Minas Gerais, desligando do TRF-1, em Brasília, em discussão desde o ano de 2013, voltou à cena face à interferência do ministro presidente do STJ, João Otávio Noronha. O presidente da Câmara dos Deputados para agradar ao magistrado pautou o andamento do Projeto, mas o relator, depois de muita pressão e numa posição mais sensata, conseguiu o adiamento para o mês julho, ainda assim muito antecipadamente, porque continuaremos em plena pandemia. Aliás, no Congresso e nas Assembleias Legislativas, registra-se a prática de, em momentos cruciais, a exemplo da pandemia, colocar em votação Projetos polêmicos, como ocorreu em Brasília com a extensão de Plano de Saúde para ex-deputados, durante esse período.

Intrigante é saber que o ministro Noronha mostrou-se desconhecer ou não considerar Ação proposta, em 2013, pela Associação de Advogados Públicos da União, questionando a criação de quatro Tribunais Regionais Federais. Na petição, alega a parte Autora que a criação de novos Tribunais é "medida ineficiente e irracional para resolver o problema da celeridade da prestação jurisdicional", porque o Tribunal a ser criado é de 2ª instância e, portanto, incompetente para solucionar as demandas do dia a dia, porquanto os desembargadores só atuam em fase de recurso.

Acerca do assunto vale recordar o exemplo do Tribunal de Justiça da Bahia que, a despeito das apertadas verbas orçamentárias, criou a denominada Câmara do Oeste, em Barreiras, com pretensão de instalação de mais uma Câmara, mas, depois de muita pressão, desistiu e fechou o único que funcionava, no Oeste da Bahia, sob o sensato argumento de que precisamos de mais juízes e não de desembargadores. Afinal, mais de 90% dos processos tramitavam no primeiro grau. Situação bastante semelhante ocorre agora com a criação de tribunais e fechamos de varas judiciais. Dizíamos naquela época, enquanto cria uma filial do Tribunal, fecham-se comarcas, porque faltam juízes e servidores. É o cúmulo da insensatez!

Naquele ano, 2013, o então presidente do STF, ministro Joaquim Barbosa, concedeu liminar, suspendendo o andamento do Projeto de criação de quatro TRFs. Esse processo foi redistribuído para o ministro Luiz Fux e até a presente data não foi pedido data para julgamento em Plenário; todavia, continua valendo a liminar concedida até que haja decisão final. Barbosa justificou a liminar com o vício de iniciativa, pois a proposta deveria originar-se do Judiciário, mas veio do Legislativo, e a falta de recursos, calculado naquela época em R$ 922 milhões. 

A nova proposta do presidente do STJ assegura que não haverá gastos e justifica com o uso de instalações dos juízes federais, em Minas, havendo promoção dos atuais magistrados. Quer dizer: fecham uma ampla porta, dos juízes federais, e abre uma porta estreita, a dos desembargadores. É risível essa alegação do presidente do STJ, pois como em 2013 seria gasto R$ 922 milhões e atualmente não haverá despesa alguma, simplesmente, com um passe de mágica, através da relocação de juízes!

Os interessados pela criação do TRF-6 não dimensionam corretamente a realidade da Justiça Federal em Minas Gerais. Na verdade, há necessidade de um TRF no estado, visando evitar o congestionamento no TRF-1, mas não ao ponto de se acreditar na alegação de Noronha de que se leva 15 a 20 anos para um julgamento de um desembargador. Noronha propõe a extinção de cinco varas federais, em Belo Horizonte, como se o mais importante fosse a Justiça de 2º grau e sem nenhum significado as Varas Federais. Engano ou interesses escusos.

Será que houve troca de favores entre Noronha e o presidente Bolsonaro, porque ocorreu muita coincidência entre a decisão do presidente do STJ, suspendendo liminar para apresentação dos exames de coronavírus pelo presidente, determinada pelo TRF-3, e a colocação em pauta da criação do TRF-6. A decisão de Noronha foi reformada posteriormente pelo STF.

Salvador, 22 de maio de 2020.

Antonio Pessoa Cardoso
Pessoa Cardoso Advogados.

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