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sexta-feira, 24 de julho de 2020

A LAVA JATO TEM INIMIGOS?

O Procurador-geral da República, Augusto Aras, parece que ocupou a chefia do Ministério Público com um objetivo: desarticular a Operação Lava Jato. Isso não causa surpresa, porque antes de assumir o posto, ele já propalava sua intenção de frear a autonomia de alguns setores do órgão que comandaria. O tiro certeiro foi dado, quando Aras requereu e o ministro Dias Toffoli, do STF, concedeu "imediato intercâmbio institucional de informações, para oportunizar ao Procurador-geral da República o exame minucioso da base de dados estruturados e não-estruturados colhidas nas investigações”. Na decisão, o ministro diz que o Ministério Público "compõe um todo intrinsecamente indivisível, sendo sua repartição em órgãos e a subordinação administrativa a coordenadores diversos justificadas apenas pela necessidade de organização administrativa e funcional que assegura à instituição a defesa dos interesses difusos e coletivos em todo o território nacional”.

O Procurador terá acesso ao banco de dados da Operação Lava Jato, a maior do mundo, em torno de 50 terabytes de informação. Essa brecha conquistada pode ter sido discutida com o presidente que, como se propala, nunca apoiou efetivamente o trabalho de Sergio Moro e Procuradores em Curitiba. Há quem diga que Bolsonaro foi o primeiro a desmantelar a Lava Jato com a retirada de Moro de Curitiba. A escolha de Augusto Aras para a Procuradoria, que não figurava na lista tríplice, é justificada por essa e outras movimentações que vieram a concretizar-se, agradando ao Palácio do Planalto. Agora, a Procuradoria centraliza todas as ações do Ministério Público, e, certamente, se o Plenário do STF, não modificar a decisão do pupilo de Lula, a Operação Lava Jato sofrerá sério revés, pois seus dados permanecerão guardados nos escaninhos da Procuradoria-geral da República, que poderão ou não serem usados, a depender da conveniência do Procurador. O acesso aos dados da Lava Jato, como bem disse o Procurador Deltan Dallagnol, é semelhante à obtenção, sem justificativa, dos dados sigilosos dos correntistas, pelo banqueiro.

O interesse do presidente Jair Bolsonaro, no trabalho de Aras, é justificado seja pela presença no prédio da Procuradoria, sem agendamento, mas principalmente, pelas investigações que se processam contra o próprio presidente, contra seus filhos e contra alguns auxiliares diretos. A Polícia Federal com investigações dos atos antidemocráticos, o facebook com a suspensão de perfis falsos, a CPI das fake News, que se processa na Câmara dos Deputados com documentação comprometedora, o TSE com o processo de cassação da chapa Bolsonaro/Mourão, que ganhou fôlego com as recentes descobertas de desinformação, originada do 3º andar do Palácio do Planalto, perturbam o sono do presidente. 

Bolsonaro, que não poupava os ministros do STF, calou e obteve retorno, consistente, por exemplo, na recente decisão sobre o foro privilegiado de seu filho, Flávio, envolvido com a "rachadinha". É jurisprudência firmada do STF de que o parlamentar que cometeu crime e deixou o mandato não tem foro especial, mas os ministros preferiram empurrar o processo e nada decidir. 

Enfim, quem se voltar para o passado constatará que o mensalão deu resultado, face ao empenho pessoal do então relator e presidente do STF, ministro Joaquim Barbosa. O processo iniciado em junho/2005, depois de um ano e sete meses, 69 sessões da Corte, condenou 24 dos 37 réus, apesar da luta em contrário de alguns ministros. Atualmente, os mesmos, Ricardo Lewandowski, seguido por Toffoli e Gilmar Mendes tentam acabar com a Lava Jato, mas a batalha é difícil.

Salvador, 23 de julho de 2020.

Antonio Pessoa Cardoso
Pessoa Cardoso Advogados.

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