A máquina, à medida que é usada, perde sua utilidade; assim também com o homem, com o passar do tempo, desaparece-lhe qualificações que dificultam sua permanência no exercício de muitas atividades. Seja o médico, o professor ou o magistrado, todos atravessam este inclemente castigo humano do "tempo de validade". A máquina é substituída por outra máquina e assim também deve acontecer com o médico, o professor ou o magistrado. No Brasil assim procedemos; entre os magistrados, há poucos anos atrás, a idade de aposentadoria subiu para 75 anos; de forma que não temos magistrados vitalícios.
Pois bem. A democracia americana e algumas leis violam este princípio universal para estabelecer que os juízes da mais alta Corte do país nunca "perdem a validade", ou seja, os julgadores da Suprema Corte podem exercer suas funções de julgar para dirimir controvérsias durante toda a vida; não importa se tem 75 ou 95 anos. Enquanto quiserem, eles continuam desempenhando a missão de julgar, pois seu afincamento nesta importante missão é vitalícia. A conclusão que se chega é que a democracia americana está envelhecida, corrompida pela tradição, neste aspecto, mantendo princípios que não se sustentam com argumentos sérios e convincentes.
Mas as leis ou princípios americanos encontram outros entraves. A pessoa condenada, depois de cumprir a pena fixada na decisão judicial, portanto passa a ser ex-presidiário, não tem o direito de votar. Só vota se dispor de dinheiro suficiente para pagar dívida, referente a multas, livramento condicional e outras taxas, obrigação imposta durante o tempo de encarceramento. É tão dramática esta situação que políticos, nos Estados Unidos, fazem campanha para arrecadar recursos a fim de quitar o débito e habilitar o cidadão, sem recursos para pagar o valor, liberando-o para exercitar o direito ao voto. Esta exigência acontece em alguns estados, a exemplo de Miami, e em outros não, a exemplo de Maine.
Outra situação dramática situa-se na frequente prisão de investigados, posteriormente condenados a muitos anos de prisão; o tempo mostra erros grosseiros, em muitas condenações, mas só depois do cumprimento de boa parte da pena determinada pela Justiça. Então, acontece de o condenado permanecer na cadeia por décadas, após o que se descobre inexatidão no inquérito. No início deste ano, um homem acusado de estupro permaneceu na cadeia por 37 anos. Intrigante é que na delegacia, duas testemunhas afirmaram que o "criminoso" estava em casa, quando ocorreu a agressão a uma mulher em sua própria residência. E mais: o exame de sangue do local do crime era incompatível com o do preso, que ficou trancafiado por todo este tempo.
Diferentemente do que ocorre no Brasil, nos Estados Unidos, o presidente passa cinco anos recusando a exibir sua declaração suspeita de renda; desde o pleito de 2016, que a então candidata democrata, Hillary Clinton, pediu ao candidato republicado, então Donald Trump, para mostrar seus pagamentos de impostos. A recusa foi peremptória e a luta para obter este esclarecimento perdura até hoje. Apesar de a Justiça já ter determinado a apresentação desses documentos, o atual presidente, Trump, recusa-se e continua a discussão nas Cortes americanas.
Enfim, a democracia, nos Estados Unidos, não é tão límpida para oferecer lições para outros povos inclusive para nós brasileiros.
Salvador, 08 de outubro de 2020.
Pessoa Cardoso Advogados.
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