É elementar, mas significativa a qualificação de ser humano, porque o homem moderno impressiona e considera, na apreciação dos bons conceitos, somente os números exibidos por seus dependentes, esquecendo-se do que está atrás da contabilidade: um homem, de carne e ossos, portanto, bem diferente da leitura fria do quantitativo. O ex-presidente exerceu a magistratura e dirigiu o Tribunal focado em outros princípios, atípicos na classe que dirigiu, no sentido de valorizar o servidor, não somente pelos números apresentados, mas anteriormente, considerando a pessoa que trabalha; é que a conduta dos homens públicos atuais não visualiza este componente observado por aquele intelectual; o servidor era prestigiado e ouvido na sua labuta diária, no sentido de ter paciência e disposição para aconselhá-lo; assim também procedia com o jurisdicionado que o procurava; tomava ciência de seus problemas e suas dificuldades e envolvia nelas para minorar o sofrimento. Quem faz isso nos dias atuais? Ele enxergava o homem para adentrar na atividade desenvolvida; encarava o cidadão compreendendo e aconselhando sobre os infortúnios na vida de cada um.
O magistrado que nos deixou aos 83 anos era um gentleman, compassivo, compreensivo, paciente e envolvente com a vivência do seu semelhante. Tinha preparo intelectual admirável e invulgar na carreira; era poliglota, cultuava a boa leitura, a música, a natureza e via no semelhante uma criatura que merecia os louros da vida. Suas qualificações não impediu, em nenhum momento, idolatrar a simplicidade, a atenção, a caridade para atender a todos que lhe procuravam. A carreira de magistrado foi antecedida pelos serviços prestados ao Ministério Público, como promotor nas comarcas de Oliveira dos Brejinhos e Bom Jesus da Lapa; como juiz serviu, no interior, nas imediação de sua tão prestigiada Macaúbas: Oliveira dos Brejinhos, Paramirim, Caetité. Daí foi promovido para Itabuna para desembarcar numa Vara de Família em Salvador.
O magistrado elasteceu atuação de projeto de vida para dedicar atenção às pessoas carentes. Pode-se afirmar, sem medo de errar, foi o presidente do Tribunal que mais aproximou dos necessitados, seja na condição de juiz nas comarcas por onde passou, como desembargador, como presidente da Corte e como pessoa humana. Amava sua cidade natal e lá construiu um pequeno templo onde foi sepultado, na mesma área que doou e construiu a FUNDAÇÃO ASSISTENCIAL DE MACAÚBAS, FAMAC, destinada a oferecer cursos profissionalizantes, aulas de música, de corte e costura, reforço escolar; neste canteiro de obras, dispunha de uma biblioteca, campo de futebol de salão e outras atividades de interesse dos mais necessitados. Para essa laboração contava com professores, funcionários, como voluntários e com ajuda da prefeitura municipal. O presidente e fundador da entidade enfrentava a pobreza de muitas pessoas através de conselhos e de ajuda financeira, usando seus próprios recursos; mas sua integração com essa gente não se limitava à ajuda material, pois usava sua argumentação para evitar, por exemplo, a separação de um casal em tramitação na Vara de Família, onde militou por muito tempo.
Tive a felicidade na condição de corregedor das comarcas do interior, de visitar o fórum de Macaúbas, juntamente com o juiz auxiliar da Corregedoria, juiz aposentado José Carlos; dedicamos parte de nosso tempo para conhecer a FAMAC e todos ficamos impressionados com o desvelo do então desembargador aposentado; a alegria que se contemplava no seu semblante, exibindo a composição de cada sala, de cada local que ele pessoalmente participou da construção, com, inclusive, a doação de boa área de terra para a instalação da FAMAC. Só se espera que os macaubenses mantenham o funcionamento dessa grande obra do ex-presidente do Tribunal.
O presidente deixou duas filhas e um cidadão que ele ajudou bastante e o tinha como pai. Em 2006, ele instalou o Núcleo de Psicologia e Assistência, com o objetivo de auxiliar o servidor do Judiciário, na valorização como ser humano. Tratava-se de uma sala, no térreo do prédio, onde o funcionário, no Tribunal de Justiça, no Centro Administrativo, e no fórum Rui Barbosa, dispunham para meditar e descansar, fora do expediente. Essas salas, depois da saída do presidente Benito, foram desativadas, porque passou-se a não se valorizar o descanso mental do servidor e do juiz. Em sua administração foram muitas as suas obras, dentre as quais destacamos: em outubro/2007, lançamento do Plano Diretor, que traçou diretrizes para gestão nos 10 anos seguintes; criou a 5ª Câmara, instalou o sistema Projudi no juizado especial cível de Defesa do Consumidor, no shopping Baixa dos Sapateiros; considerou o evento histórico pela libertação do processo sem papel. Nesse particular, editou três livros sobre padronização de despachos e sentenças na Vara de Família, inserido nessa batalha contra a burocracia, que emperra a movimentação da Justiça. Muitas outros empreendimento foram promovidos na administração. No dia 07/11/2007, o presidente entregou a presidência ao seu vice-presidente, desembargador Sinésio Cabral, face à aposentadoria compulsória, que se dava aos 70 anos.
No domingo, 18/04/2021, às 11.30h, na Igreja da Vitória, em Salvador, estivemos presentes, com nossa família, a uma missa que mandamos celebrar pela alma de figura tão ilustre e inusitada no nosso mundo; quando o presidente Benito Alcântara estava sendo sepultado em sua terra natal, nós estávamos rezando pela vida deste homem que deixa um vazio enorme, principalmente na assistência aos carentes e necessitados. Benito está emoldurando, em lugar de destaque, a galeria de pessoas ilustres na outra vida para onde foi levado.
Salvador, 20 de abril de 2021.
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