segunda-feira, 29 de agosto de 2022

O BRASIL CONHECE OS CRIMES DE BOLSONARO?

Com o titulo acima, Celso Rocha de Barros, servidor federal, doutor em sociologia pela Universidade de Oxford (Inglaterra), escreve no jornal Folha de São Paulo.

O Brasil conhece os crimes de Bolsonaro?


Falta de respostas institucionais aos crimes do presidente reduziu impacto de mídia das denúncias

Na última segunda-feira, Jair Bolsonaro deu sua entrevista de candidato ao Jornal Nacional. A uma certa altura, a jornalista Renata Vasconcellos perguntou se Bolsonaro se arrependia de ter imitado pacientes de Covid-19 em processo de asfixia.

O surpreendente foi que, assim que Vasconcellos falou do escândalo, as buscas por "Bolsonaro imita falta de ar" no Google dispararam. O comando da campanha de Bolsonaro ficou apavorado com a repercussão do escândalo.

Ficou a dúvida: até a entrevista, as pessoas não sabiam que Bolsonaro havia feito a imitação? Ela foi amplamente noticiada quando aconteceu.

No ano passado, dei uma palestra sobre a gestão da pandemia no Brasil. Citei duas análises estatísticas, feitas com dados revelados pela CPI da Covid: a estimativa de 95 mil pessoas mortas porque Bolsonaro não aceitou as ofertas de vacinas da Pfizer e do Butantan, feita pelo epidemiologista Pedro Hallal para a Folha, e a análise da equipe de dados do jornal O Estado de S. Paulo que mostrou que cerca de 70 mil idosos morreram entre janeiro e maio de 2021 só pela recusa da oferta do Butantan.

Essas análises foram publicadas por grandes jornais. O perfil do público da conferência era de universitários altamente qualificados, provavelmente contrários ao governo Bolsonaro. Mas um grande número deles me disse que não conhecia esses dados chocantes.

Como isso é possível?

Tenho uma hipótese: a falta de respostas institucionais aos crimes de Bolsonaro reduziu o impacto de mídia das denúncias.

No dia seguinte à denúncia de cada crime, não havia mais notícias –nenhuma CPI foi instalada e Aras matou as investigações; ou, quando houve CPI, o centrão protegeu Bolsonaro do impeachment. No final, cada crime ia sumindo conforme Bolsonaro cometia um crime novo.

Sem novas notícias, o tema ia parar nas colunas de opinião (como a minha), e fatos indiscutíveis pareciam se tornar "temas para debate". Nos telejornais, em especial, onde não há colunas de opinião, a notícia sumia.

O contraste com a repercussão dos escândalos do PT é notável: na segunda-feira tinha a denúncia, na terça tinha o pedido de CPI, na quarta caía o ministro, na sexta a CPI era implementada, tinha julgamento, tinha prisão. As instituições respondiam à denúncia, e o caso continuava na página de notícias do jornal e nos telejornais.

Além das estimativas sobre quantos brasileiros Bolsonaro matou durante a pandemia, há vários crimes do atual governo que o público não conhece porque as instituições deixaram a notícia morrer.

Quantas pessoas de fato sabem o que é o orçamento secreto, ou como ele se compara com outros escândalos de corrupção? Se uma CPI tivesse sido instaurada, se deputados tivessem sido cassados, se Arthur Lira tivesse caído, todos saberiam. Mas nada disso aconteceu.

Esse mesmo mecanismo funcionou para acobertar o assassinato em massa cometido por Bolsonaro durante a pandemia, a renúncia inédita dos chefes das Forças Armadas em protesto contra o aparelhamento, a tentativa de golpe do 7 de Setembro de 2021, e, é claro, o desmonte dos mecanismos de combate à corrupção por Bolsonaro.

Resta torcer para que, como aconteceu na última segunda-feira, a campanha eleitoral exponha ao público os crimes de Bolsonaro que sumiram do debate porque ninguém fez nada para puni-los. 

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