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domingo, 11 de setembro de 2022

"AS ROSAS NÃO FALAM"

Joaquim Falcão é professor e doutor pela Universidade de Genebra, mestre pela Harvard Law School e ex-membro do CNJ. Falcão conhece bem o STF e seus livros mostram a angústia de quem gostaria ter uma Corte de Justiça que obedecesse suas próprias "leis", a exemplo do pedido de vista, com objetivo de paralisar o julgamento. 

O ARTIGO ABAIXO, PUBLICADO NO JORNAL FOLHA DE SÃO PAULO, É LEITURA INDISPENSÁVEL PARA O OPERADOR DO DIREITO.

As rosas não falam

Por favor, ministra, coloque ordem no Supremo

"As rosas não falam", diria o sambista maior, Cartola. Sobretudo a ministra Rosa Weber. A partir de segunda-feira (12), presidente do Supremo Tribunal Federal.

Indicada por Dilma Rousseff (PT) em 2011, quase nada fala. Não dá entrevista. Não vai à rádio ou televisão. Nem tem rede social. Não posta no Twitter. Não fala fora dos autos.

Em outubro de 2023, cairá na compulsória e sairá. Mandato curto. O que fará neste período? Qual seu projeto? Qual contribuição para a democracia?

O Supremo está sob ataque externo. Sobretudo dos Poderes Executivo e Legislativo. E milícias. Bolsonaristas ou não.

Mas não se entra em batalha com casa desarrumada. O Supremo está desarrumado.

Mais do que nunca, o país precisa do Supremo unido. Previsível e célere na maneira de decidir: quem, como e quando. O mal-estar é palpável.

A insegurança jurídica, a incerteza econômica e a imprevisibilidade política são alimentadas diariamente não por suas decisões. Mas pela maneira como são tomadas.

Não precisamos do irrealismo mágico de teorias importadas para explicar. Nem se desiludir com o Estado democrático de Direito.

O Supremo deixou de ser instituição convergente. Passou a ser um "intra-brigante".

É detentor da palavra final, como rezava o ministro Celso de Mello. Mas, hoje, a palavra final não é do colegiado. Foi privatizada pelo individualismo e posições de alguns ministros. O Brasil ficou temporário. Em suspense judicial.

O cerne do mal-estar é a simbiose entre a privatização monocrática e o "pedido de vista-bloqueio".

Faz 359 dias que o ministro Kassio Nunes Marques pediu vista no processo que avaliaria decretos de Jair Bolsonaro (PL) sobre armas para a população. Provavelmente esperava passarem as eleições com um Brasil armado. Mesmo com a votação parcial de 3 a 0, paralisou o processo. Vista de conveniência.

O relator, ministro Edson Fachin, tinha que esperar a devolução dos autos. Marques não devolveu. Abuso de autoridade. Com impaciência democrática, nesta semana, Fachin agiu. Suspendeu parte dos decretos.

Argumentou: a matéria era urgente ante o risco de violência política na campanha eleitoral.

Foi autodefesa do colegiado, dos demais ministros, do Supremo e da democracia. Criou precedente. Não mais inércia diante de "pedidos de vista-bloqueio".

A nova lei de abuso de autoridade, de 2019, diz que é crime, sob pena de detenção de seis meses a dois anos e multa, "demorar demasiada e injustificadamente no exame de processo de que tenha requerido vista em órgão colegiado, com o intuito de procrastinar seu andamento ou retardar o julgamento".

O regimento interno do Supremo dá prazo máximo de 30 dias para devolver o processo. O Código de Processo Civil, dez dias. Depois o presidente coloca na pauta. Com ou sem o voto. Simples assim.
Por favor, ministra Rosa Weber, coloque ordem. Ministro não é supremo. Em nenhuma nação do mundo. A instituição tem que ser previsível. Ter prazos decisórios, segurança jurídica.

O devido processo legal pede que não se frequente palácios. Nem almoços com autoridades. Não se negocie. Sobretudo com partes processuais e interessadas. Não conversar em "on" ou "off" com a mídia. Que se queixem às rosas.

Não se expor festivamente aos lobbies judiciais e da advocacia. Agenda transparente.

Gilberto Freyre dizia que os juristas, por formalismo exagerado, se isolaram da realidade brasileira. Precisariam de psicanálise para reencontrá-la.

Talvez não tanto. Mas Sócrates dizia que o mais importante da vida era o "conhece-te a ti mesmo".

Restaurar, dentro do Supremo, a maneira de decidir poderá ser seu maior legado para o Estado democrático de Direito. E assim, bate outra vez, com esperanças, o coração da Justiça.

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