domingo, 19 de fevereiro de 2023

COLUNA DA SEMANA

O Judiciário atravessa forte crise nesses últimos anos, principalmente pela descompostura de alguns ministros que, sem a menor cerimônica, desvestem da toga para debater ou produzir revelações de interesse político, oferecendo sugestões sobre a vida do país e até de casos que estão em seus gabinetes para julgamento. Não há em todo o mundo um Tribunal superior tão desvestido de suas funções primordiais como no Brasil. Os erros de conduta dos ministros iniciam com a participação frequente em eventos jurídicos ou não, no Brasil, mas principalmente no exterior. Eles andam à busca de um convite para pronunciar uma palestra. É raro o mês que um ministro da Corte não se ausenta para viagem a este ou àquele país, apesar da carga imensa de trabalho que lhe espera no gabinete. Por outro lado, não se vê igual conduta de ministros de Cortes superiores de outros países, deslocando para o Brasil ou para outros países para proferir palestras e outras escapatórias.

Diante de todo este triste cenário, ainda assim, a sociedade respeita e, silenciosamente, admite o crescente protagonismo do Judiciário, fundamentalmente do STF, na área política. Parece que não existe limite do enfronhamento dos ministros com atividade que não se situa na sua missão, seja manifestando pela imprensa falada e escrita, seja aproximando exageradamente dos políticos, mesmo que tenham algum julgamento adiante de interesse deles. Os ministros Gilmar Mendes, Ricardo Lewandowski, Dias Toffoli, Roberto Barroso e Alexandre de Moraes, além de outros, não se sentem constrangidos para servirem do cargo que ocupam e fazer premonições de natureza polítca, incondizentes com a discrição de sua tarefa. Afinal, a independência do Judiciário e a fortaleza que lhe conferiu a Constituição de 1988 pressupõe que os juízes assumam comportamento imparcial, independente sem adentrarem para o campo do debate, mais apropriado para os parlamentares.  

Os magistrados, principalmente os da Suprema Corte, falam demais, não se limitam a usar sua energia somente nos autos; extrapolam para proferir palestras ou para conceder entrevistas expondo, indiscretamente, seus posiconamentos sobre os graves problemas do país. A austeridade, infelizmente, não acompanha esses magistrados, talvez até porque desembarcam no plenário da Corte sem nunca ter julgado. Nesses últimos tempos, o ministro Alexandre de Moraes tem-se destacado por manifestações  políticas ou antecipando fatos, envolvendo processos sob sua relatoria e, às vezes, em segredo de Justiça. Nessa conjuntura, perdem os ministros as estribeiras para discutir temas que não inserem na sua competência, mas de interesse de empresários ou de políticos. Parece até que nunca depararam com o que dispõe o art. 36, III da Lei Orgânica da Magistratura: 

"É vedado ao magistrado manifestar, por qualquer meio de comunicação, opinião sobre processo pendente de julgamento, seu ou de outrem, ou juízo depreciativo sobre despachos, votos ou sentenças de órgãos judiciais, ressalvada a crítica no sautos e em obras técnicas ou no exercício do magistério".  

O exercício da magistratura não se situa em palestras, em seminários, em outros eventos, mas limita-se aos autos e o desvio mostra a desordem imprimida à arte de julgar. A emissão de opiniões nesse convívio com a sociedade foge da atribuição do magistrado e despenca para a busca de estrelato. O debate sobre os problemas nacionais que nos afligem não é missão dos ministros, que deveriam guardar silêncio sobre o tema, mais adequado para os políticos. A resposta do ministro Barroso a uma deputada que mostrou o risco de Bolsonaro ganhar a eleição é sintomática: "é preciso não supervalorizar o inimigo" ou "essa atitude negacionista do governo federal...".  

Salvador, 19 de fevereiro de 2023.

Antonio Pessoa Cardoso
Pessoa Cardoso Advogados.

 



 

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