domingo, 6 de outubro de 2019
COLUNA DA SEMANA
MUNICÍPIOS ABERTOS E COMARCAS FECHADAS
O Poder Legislativo, representado pelos vereadores, está presente em todos os 5.570 municípios brasileiros; na Bahia são 417, dois dos quais, Luis Eduardo Magalhães, no Oeste, e Barrocas, no Nordeste, foram criados no ano 2000; também o Executivo, representado pelo prefeito, está em todos os municípios. Cada um desses poderes possui grande infraestrutura: o Legislativo, por exemplo, dispõe de um mínimo de 9 vereadores, nos municípios de até 15 mil habitantes; cada um deles conta com grande número de funcionários e infraestrutura significativa. Calcula-se que as despesas mínimas anuais de um município situa-se em R$ 1 milhão.
É intrigante o descompasso entre a criação de municípios e a simples manutenção de Comarcas, criadas 50, 100 anos atrás. Enquanto os municípios possuem um prefeito, uma Câmara Legislativa, com secretarias e enorme quadro de funcionários, o Judiciário tem organização dessemelhante, porque as unidades jurisdicionais agregam dois ou mais municípios para formar uma Comarca e ainda assim é composta de um juiz, promotor e funcionários. O Judiciário é o único dos três poderes que não se mostra presente em todos os municípios.
A competência para legislar sobre a criação de Comarcas é do Legislativo, mas, na prática, a competência para extinguir, ao menos na Bahia, é dos Tribunal. Assim, a Bahia editou a Constituição do Estado, em 1989, e estabeleceu no art. 121:
“a cada município corresponderá uma comarca...".
Mais adiante, a Lei de Organização Judiciária, Lei n. 10.845 de 2007 fixou no art. 20:
"A cada município corresponde uma Comarca".
O legislador de 2007 avançou, seguindo o preceituado na Constituição, porquanto no regime da Lei de Organização Judiciária de 1979, Lei n. 3.731, fixava-se que “as Comarcas poderão compreender mais de um município,...".
Portanto, foi determinado pela Constituição e pela Lei de Organização Judiciária que "a cada município corresponde uma Comarca", e não mais “as Comarcas poderão compreender mais de um município”.
Continuam em vigor a Constituição do Estado e a Lei de Organização Judiciária, mas os desembargadores da Bahia, entendendo que a sobrevivência das Comarcas depende de suas arrecadações ressuscitaram a Lei 3.731, que não mais vigora, para extinguir Comarcas, através de Resoluções, criadas por meio de leis; ao invés de instalar novas unidades, como procedeu corretamente o ex-presidente do Tribunal de Justiça da Bahia, des. Mário Albiani, diminuíram o número de unidades, invertendo a ordem de mais municípios, menos Comarcas.
Nesses últimos seis anos fecharam quase 100 comarcas ou varas judiciais. Sempre com o fundamento de que foi determinação do Conselho Nacional de Justiça ou de que a verba orçamentária não permite manter unidades que não tenham um mínimo de movimento. O Tribunal da Bahia passou a andar feito caranguejo, para os lados e lentamente.
Não fizeram estudo ou análise para os cortes, porquanto abandonaram os prédios dos fóruns e as casas de juízes, sem o mínimo de conservação, além de violar de cheio com o direito de acesso à Justiça, vez que muitos jurisdicionados são obrigados a deslocar mais de 100 quilômetros para encontrar uma Comarca funcionando.
Uma luz no final do túnel: o conselheiro André Godinho, do CNJ, freou o instinto de fechar Comarcas na Bahia e determinou o funcionamento de Maragogipe, poucos meses antes lacrada pelo Tribunal; junto com essa decisão, veio outra, logo em seguida, da conselheira Maria Tereza Uille Gomes que determinou a abertura das 17 outras comarcas interditadas pelo Tribunal neste ano de 2019.
Já dissemos que uma escola só funciona se tem professor e estrutura para atender aos alunos; um hospital só desempenha sua atribuição, se dispor de médicos, enfermeiros e de toda a infraestrutura necessária; uma empresa privada só produz lucros se tem produtos para venda, se dispõe de funcionários em quantidade suficiente para atender à clientela.
Enfim, não se pode fechar uma comarca porque tem poucos processos, se ela não dispõe de juiz.
Salvador, 5 de outubro de 2019.
Antônio Pessoa Cardoso
Pessoa Cardoso Advogados.
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