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sábado, 15 de junho de 2024

ABORTO: MENINA É PUNIDA

Com Arthur Lira na presidência da Câmara dos Deputados, muitos projetos absurdos são discutidos e tornam-se leis. É o que poderá acontecer com o Projeto de Lei 1.904/24, que teve tramitação e votação relâmpago, terminando pela aprovação na quarta-feira, 12, sem passar pelas comissões. O Projeto será submetido ao Plenário, mas ainda não se indicou data; o texto foi apresentado pelos evangélicos, endossado pelo presidente Arthur Lira, e equipara o aborto ao crime de homicídio, ou seja, os abortos realizados fora das 22 semanas de gestação passarão a ser considerados homicídio, sem observar para o fato de a mulher ser vítima de estupro. Explicando melhor: a menina é estuprada e será penalizada, com grau de culpa superior ao autor do estupro. O estuprador pode ser condenado a até 12 anos, enquanto a estuprada será punida com até 20 anos. O Anuário Brasileiro de Segurança Pública de 2023 demonstra que o estupro é, essencialmente, um crime cometido contra crianças, pois 61,4% das mulheres estupradas tem, no máximo, 13 anos, e demoram para descobrir que estão grávidas.

O presidente da Câmara foi questionado, porque o Projeto teve votação irregular, vez que "o regimento indica que o presidente precisa, no mínimo, informar para o plenário qual o projeto que está sendo votado. Esse registro precisa aparecer no painel de votação e nada disso aconteceu", segundo denunciou a deputada Sâmia Bofim. O Projeto foi apresentado pelo deputado Sóstenes Cavalcante, amigo do pastor Silas Malafaia, e toda a articulação contou com apoio e trabalho desenvolvido pela bancada evangélica. Está-se buscando modificar quatro artigos do Código Penal, tornando crime o que hoje não é configurado como delito ou que fixa pena de até quatro anos, passando para 20 anos de cadeia. Também é alterada a responsabilidade dos médicos que passam a ser punidos no caso de interromper a gravidez de feto que não seja anencéfalo. Na verdade, o Projeto obriga as vítimas a terem filhos dos seus estupradores. 

Os evangélicos dizem que o Projeto responde a uma decisão monocrática do ministro Alexandre de Moraes, do STF, que, em um caso específico, referente a gestação de mais de 22 semanas derivada de estupro, derrubou norma do Conselho Federal de Medicina sobre a proibição da interrupção da gravidez. O método dos evangélicos consiste no uso de medicações para interromper os batimentos cardíacos do feto, antes de ser retirado do útero. Quer dizer, mata-se e depois retira o feto sem vida do útero da mulher. A crueldade dessa sistemática é tamanha que não é usada nem em animais. No Brasil, o aborto é permitido em situações enunciadas na lei: para salvar a vida da mãe; gestação resultante de estupro e feto anencefálico, ou seja, um bebê natimorto. Portanto, a lei considera legal o aborto desde que a gestação seja originada de estupro. Na forma do Projeto, o procedimento só poderá acontecer até a 22ª semana; fora deste tempo a prática é criminalizada. Se o Projeto dos evangélicos tornar lei, evidente que a matéria será submetida ao STF e a inconstitucionalidade é resultado do abuso de legislar, porque violadora dos princípios da dignidade humana.   

Salvador, 15 de junho de 2024.

Antonio Pessoa Cardoso
Pessoa Cardoso Advogados.



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